Educação & Cultura
Boa gestão do tempo pode garantir melhores aulas e mais saúde mental
Planejar não só as aulas, mas a rotina como um todo, representa oportunidade para otimizar o trabalho e garantir equilíbrio com vida pessoal
Cumprir o conteúdo programático, planejar aulas criativas, garantir a aprendizagem, organizar tarefas burocráticas, lidar com os imprevistos sempre presentes na sala de aula… Quantas vezes ao olhar para todas as tarefas a serem cumpridas e o tempo para realizá-las, você, professor, pensou que a conta não fechava?
Diante dessa situação, a gestão do tempo é uma temática crucial para assegurar tanto a qualidade das aulas, como o equilíbrio quando o assunto é a saúde mental.
O trabalho do educador não se resume ao planejamento e realização das atividades somente em sala de aula. Há correção de provas, preenchimento de documentos e reuniões, que dão ainda mais a sensação de que nos faltam horas no dia.
Silvana Tamassia, professora, doutora em Psicologia da Educação e cofundadora da Elos Educacional, pontua que um dos grandes desafios para que o professor possa fazer a gestão do seu tempo são as jornadas de trabalho intensas que costuma enfrentar.
Assim, separar momentos para planejar não só as aulas, mas toda a rotina, inclusive reuniões e atividades pessoais, pode parecer uma tarefa extra e desnecessária em uma agenda já lotada. Porém, pelo contrário, fazer essa organização representa uma oportunidade para garantir otimização de tempo – e até mais tempo para a família ou momentos de lazer.
Dicas para o planejamento das aula
Ter alguns processos já organizados pode ser uma carta na manga para os professores ganharem tempo. “Ajuda muito, por exemplo, ter um horário fixo para fazer o planejamento e um modelo já definido”, aconselha Silvana. Esse formato pode ser o mesmo disponibilizado pela rede ou escola, ou elaborado pelo próprio docente com campos predefinidos.
Outra dica é reunir referências de pesquisa e ter uma lista de quais livros paradidáticos, jogos e outros recursos pedagógicos estão disponíveis para uso na escola. “Isso agiliza bastante o momento do planejamento, pois, ao pensar a aula, o professor já acessa o material que pode ser utilizado para criar diferentes estratégias de trabalho”, explica Silvana.
Intencionalidade pedagógica
Colunista da NOVA ESCOLA e professora de Matemática nos Anos Finais na Escola EMEFETI Governador Carlos Lindenberg (ES), Rosiane Prates reconhece que equilibrar um currículo extenso e um processo de ensino-aprendizagem contínuo que se dá em diferentes tempos para cada aluno é uma tarefa complexa. Por isso, dentro do seu planejamento há um ponto central: a intencionalidade pedagógica.
Alinhar esse ponto às aprendizagens previstas, segundo Rosiane, faz com que ela não perca o foco e, mesmo nas propostas mais leves ou diferenciadas, consiga estar conectada com os objetivos de aprendizagem. Caso a atividade, ainda que divertida ou interessante, não contribua nesse sentido, é a oportunidade de reavaliar a necessidade de adotá-la.
Silvana complementa que, a partir dessas habilidades e competências a serem desenvolvidas, o professor pode pensar em atividades que ele já tenha aplicado e que podem ser adaptadas para o contexto e as necessidades da atual turma.
“Outro ponto importante é sempre prever um momento ao final da aula, de aproximadamente cinco minutos, para ouvir os estudantes e captar o quanto aprenderam do que era esperado para aquela aula e ter insights para melhorar o planejamento das próximas. Assim, o trabalho estará cada vez mais alinhado às necessidades dos estudantes”, diz Silvana.
Envolva os alunos na organização das atividades
A professora Adriana Souza, que dá aulas de Matemática no Centro Juvenil de Ciência e Cultura de Vitória da Conquista (BA) para alunos do 9º ano do Ensino Fundamental até a 3ª série do Ensino Médio, conta que sempre gostou de trabalhar com aulas dinâmicas, envolvendo metodologias ativas e propondo atividades inovadoras.
“Ter um planejamento diferenciado exige mais cuidado. Observo os recursos que a escola disponibiliza, converso com a gestão para identificar espaços. Além disso, já separo materiais que vou precisar (vídeos, aplicativos etc) e testo antes para me certificar se os recursos estarão disponíveis para os alunos”, detalha. Tudo isso faz com que, no momento da aula, não se perca tanto tempo.
Promover atividades que destaquem o protagonismo dos alunos exige uma parceria com a própria turma, o que facilita a gestão da sala, garante a organização e o melhor aproveitamento do período. Por isso, é importante engajar a todos nesse compromisso.
“Ter rotinas claras e compartilhadas com os estudantes ajuda bastante. Por exemplo, algumas salas já possuem combinados para as idas ao banheiro, com uma plaquinha disponível que indica se alguém já está usando ou se está livre. Assim, não precisam interromper a aula”, relata Silvana.
Para organizar e gerenciar os trabalhos em grupo
Silvana cita uma dica dada por Rachel Lotan, uma das autoras do livro Planejando o Trabalho em Grupo: Estratégias para Salas de Aula Heterogêneas, que sugere deixar as orientações para a atividade por escrito e distribuir para um representante do grupo que será o mediador. Assim, todos terão o mesmo comando e, se houver dúvidas, terão como solucioná-las sem que o professor tenha que passar novamente pelos agrupamentos, oportunizando que o docente observe com mais atenção os estudantes em ação e identifique quais dúvidas ainda estão precisando de maior aprofundamento.
A autora também sugere outros papéis no grupo que podem contribuir para essa gestão da aula, como os monitores de recurso, que ficarão responsáveis em buscar os materiais necessários para o trabalho, sem que todos precisem se deslocar e liberando o professor para seguir com as atividades, otimizando o tempo em sala de aula.
A gestão escolar também pode auxiliar essa organização
Além do período que os professores passam com os estudantes, está o tempo de reuniões coletivas nas escolas, principalmente, naquelas que já possuem a jornada ampliada, o que acaba ocupando boa parte das horas da semana dos docentes. Silvana Tamassia ressalta que quando esse tempo para reuniões e planejamento coletivo na escola é bem utilizado, ele contribui de forma expressiva para o trabalho do professor, “mas, quando esses horários não são bem pensados pela equipe gestora da escola, eles acabam gerando um mau uso do tempo e, em vez de contribuir para um planejamento mais qualificado, acabam ocupando as horas com demandas informativas, que poderiam ser compartilhadas por escrito, sem necessidade de todos estarem reunidos.”
Tenha mais tempo para si
Conseguir fazer uma melhor gestão do tempo para realizar as tarefas da escola com mais organização e agilidade, ajuda a manter o trabalho em dia, as turmas engajadas e o foco nos objetivos de aprendizagens. Por outro lado, também é uma forma dos professores tentarem equilibrar da melhor maneira a vida profissional e pessoal.
“Entendo que o professor precisa cada vez mais delimitar os espaços de trabalho e de vida pessoal, a fim de ter uma melhor qualidade de vida. É importante fazer bom uso dos momentos destinados ao planejamento no ambiente escolar. Praticar o estar presente naquilo que está fazendo para evitar ou diminuir o número de tarefas não concluídas e deixadas para fazer nos momentos que poderiam ser de descanso, lazer ou estar com a família”, pondera a professora Rosiane.
Adriana também precisa prever tempo para suas atividades acadêmicas para seu doutorado. “Faço um planejamento semanal e mensal, priorizando e distribuindo tarefas. Crio compromissos de entrega comigo e estabeleço metas para tentar não acumular.”
Além disso, o exercício de priorizar e estabelecer prazos ajuda a não perder de vista as necessidades dos momentos de pausa. “A saúde mental é essencial. Então, eu também sei que, apesar da rotina de muito trabalho, é importante estabelecer limites para evitar sobrecarga. Por isso, reservo momentos para descansar, dedicar-me à família, assistir a um filme e conversar com os amigos”, diz Adriana.
“Atividades de lazer e descanso ajudam o cérebro a ficar mais criativo e aumentam o repertório pessoal”, acrescenta Silvana. Para colaborar com um planejamento que inclua esses momentos, a educadora cita o economista Carlos Matus que traz uma categorização organizada em importância, rotina, urgência e pausa. As categorias podem orientar o planejamento cotidiano ou individual e a dica é dividir 30% do tempo para as tarefas das categorias importante, rotina e urgência e 10% para a pausa.
“As categorias ajudam a entender como organizar o tempo e as pausas são importantes. Imerso na rotina, o professor, muitas vezes, as ignora desencadeando um processo de ansiedade, estresse, relações interpessoais menos calorosas e receptivas e desânimo”.