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Lula solta R$ 7,2 bi em emendas para agradar o Congresso: articulação ou moeda de troca?
Enquanto o país pegava fôlego para as festas de fim de ano, o governo Lula aproveitou dezembro para abrir os cofres e despejar R$ 7,22 bilhões em emendas parlamentares. Foi tudo bem calculado. Entre os dias 11 e 14, a grana chegou direto às mãos dos deputados e senadores — uma medida que é legal, claro, mas que sempre deixa no ar aquela velha pergunta: governabilidade ou toma-lá-dá-cá?
A prática não é nova, mas o momento é significativo. O presidente Lula precisa de votos para tocar a pauta de ajuste fiscal, aprovar o pacote de gastos públicos e não perder a mão com uma base aliada ainda meio arisca. Não foi por acaso que o dinheiro entrou em cena em plena reta final do ano legislativo.
Não é de hoje que o Supremo Tribunal Federal (STF) pega no pé quando o assunto é emenda parlamentar. Transparência virou palavra de ordem. Desta vez, porém, o governo se escorou num parecer da Advocacia-Geral da União (AGU) — divulgado no dia 10 de dezembro —, que deu carta branca para o pagamento das emendas orçamentárias de 2024 e dos famosos “restos a pagar”. A leitura foi simples: pagar é possível, desde que dentro das novas normas.
Claro que o parecer não agradou todo mundo. Parlamentares independentes e da oposição não perderam tempo em apontar o dedo, alegando que o governo estaria contornando as exigências do STF para liberar os recursos a toque de caixa. Mas, para a AGU, está tudo dentro das regras.
Vamos ao número miúdo. Desses R$ 7,22 bilhões, a parte mais gorda foi destinada às famosas “emendas PIX” — aquelas que vão direto para estados e municípios sem precisar especificar onde serão usadas. Uma grana solta, fácil de aplicar e quase sem rastro. Olha só:
- Emendas PIX (transferências especiais): R$ 3,2 bilhões;
- Emendas individuais (RP6): R$ 250 milhões;
- Emendas de bancada (RP7): R$ 373,4 milhões;
- Saúde (todas as categorias): R$ 3,85 bilhões.
O governo também anunciou que ainda tem R$ 440 milhões no forno, prontos para sair do papel até a segunda-feira, dia 16.
Quem olha para esse movimento sem uma lente política pode pensar: “Ok, o dinheiro vai para estados e municípios”. Mas há sempre um contexto — e nele, as emendas parlamentares se tornam uma arma poderosa de negociação. Não é segredo que Lula, mesmo com o Congresso mais amigável do que o antecessor enfrentou, precisa garantir apoios com algo mais concreto que simples promessas.
Em ano de aperto fiscal e com a agenda cheia de pautas espinhosas, como o controle de gastos, o Executivo não pode perder votos. A liberação das emendas é uma mensagem direta: “Aprova aí, que a grana chega”.
Por outro lado, a prática gera um burburinho inevitável. Enquanto a base governista defende que os recursos são fundamentais para atender demandas locais e equilibrar o Orçamento, críticos dizem que isso é só uma versão disfarçada de compra de apoio político.
O roteiro é conhecido. Toda reta final de ano legislativo vira palco de um leilão silencioso entre o Executivo e o Congresso. O governo de turno — seja qual for — solta as emendas para ganhar tempo, votos e aliados.
No caso de Lula, o próximo ano promete ser ainda mais tenso. O Orçamento de 2024 já está na mesa e, com ele, a expectativa de novas disputas sobre como e onde a grana pública será aplicada. O Executivo vai ter que andar na corda bamba entre fiscalizar a gastança e não desagradar o Congresso. Vai ser difícil agradar todo mundo.
É jogo conhecido, mas que sempre deixa o cidadão com aquela sensação incômoda de que a política anda, mas a conta é nossa. Enquanto isso, deputados, senadores e o governo seguem jogando o jogo, cada um cuidando do seu lado do tabuleiro. Quem paga para ver? Sempre a gente.