Saúde
Referência mundial: conheça a história do PNI, o programa de imunização brasileiro
A partir da criação do PNI em 1973, foram organizadas inúmeras campanhas de vacinação, tais como a de erradicação da varíola; poliomielite e gripe
Em 1976, o médico Airton Zuquetto Dutra disse: “me tornei um fanático por vacina”. A afirmação, que pode parecer um tanto quanto exagerada, na verdade reflete a realidade de quem testemunhou finais trágicos que poderiam ser evitados com a imunização adequada. Zuquetto Dutra integrou o grupo dos primeiros auxiliares de epidemiologia treinados para atuar em investigação epidemiológica no Rio Grande do Sul.
Conta o médico que atendeu uma criança de 1 ano e 8 meses com poliomielite transversal irreversível: “dizer o quê, para a mãe, naquele momento? Se tivesse vacinado a criança, nada teria acontecido. Acompanhei o caso com relatórios por 90 dias, a mãe andou até em benzedeira, nada adiantou. Me tornei um fanático por vacina.”*
Quando o assunto é imunização, três palavras colocam o Brasil como destaque no cenário internacional: Programa Nacional de Imunizações. Criado em 18 de setembro de 1973, o Brasil passou a investir pesado em saúde com campanhas nacionais de vacinação (voltadas em cada ocasião para diferentes faixas etárias); capacitação e atualização técnico-gerencial para os gestores; vigilância de eventos adversos pós-vacinais e universalidade de atendimento.
O PNI está disposto na lei 6.259/75, que também dispõe sobre a organização das ações de vigilância epidemiológica e estabelece normas relativas à notificação compulsória de doenças.
Jornal O Globo. 25/9/1973. Clique na imagem para ampliar
Antes de 1973, a população brasileira sofreu com as doenças imunopreveníveis. Confira algumas datas e fatos históricos das doenças e imunizações no Brasil e no mundo:
– 1563: a primeira epidemia de varíola é registrada na Bahia, disseminando-se para o restante do País.1796: descoberta a primeira vacina pelo cientista britânico Edward Jenner.
– 1887: Brasil começa produzir a vacina contra varíola em vitelos de laboratório, graças ao Barão Pedro Afonso, diretor da Santa Casa de Misericórdia de São Paulo.
– 1889: surto de peste bubônica se propaga no porto de Santos, levando o governo a adquirir a Fazenda Butantan para instalar um laboratório de produção de soro antipestoso, vinculado ao Instituto Bacteriológico (hoje Instituto Adolpho Lutz).
– 1900: A febre amarela constituiu-se no problema de saúde pública mais sério para o Brasil, com alto índice de mortalidade.
– 1903: Oswaldo Cruz é nomeado diretor-geral de saúde pública. O Rio de Janeiro sofre epidemias de peste bubônica, febre amarela e varíola.
– 1904: estabelecida a obrigatoriedade da vacina contra varíola no Brasil por decreto do governo Federal. Isso gera um sério levante popular conhecido como a Revolta da Vacina.
– 1935: descoberta a primeira geração de vacina contra febre amarela.
– 1956: no Brasil, deste ano até 1970, o Departamento Nacional de Endemias Rurais executa a vacinação contra a febre amarela.
– 1973: fim das campanhas de vacinação contra a varíola no Brasil. O País recebe a certificação internacional da erradicação da enfermidade pela OMS.
– 1973: É formulado o PNI – Programa Nacional de Imunizações. Seus objetivos são a promoção do controle do sarampo, tuberculose, difteria, tétano, coqueluche e pólio e a manutenção da situação de erradicação da varíola.
– 1977: Brasil define as vacinas obrigatórias para os menores de 1 ano de idade – contra tuberculose, poliomielite, sarampo, difteria, tétano e coqueluche.
– 1986: É criado no Brasil o Zé Gotinha, marca-símbolo da campanha contra a poliomielite.
– Século XX: A vacina efetiva-se como prática rotineira de prevenção e controle de doenças em grandes populações.
A última vacina de destaque difundida no Brasil foi aquela contra o HPV, em 2018, ampliada para meninos de 11 a 15 anos. De acordo com livro “Programa Nacional de Imunizações – 30 anos”, do ministério da Saúde, o “catecismo” do PNI é o agir sempre, nas campanhas e no dia a dia dos postos de vacinação. O livro foi publicado em 2003 e, naquela época, os autores afirmavam categoricamente que “no Brasil, não há falta de vacina”.
Abastecimento: ontem e hoje
Se anteriormente a dificuldade era técnica – o desenvolvimento da vacina em si em laboratórios – atualmente, encontramos obstáculos ideológicos no que se refere à vacinação. Cresce no Brasil e no mundo o movimento antivacina, especialmente motivado pela covid-19. Há céticos quanto à eficácia do imunizante, já que ele foi desenvolvido em tempo recorde, quando outros imunizantes levaram anos para ser desenvolvidos.
Acontece, no entanto, que o empenho mundial em descobrir a solução para a pandemia movimentou laboratórios e pesquisadores do mundo todo, além, de, claro, incitar os governos para apoiar as pesquisas. Com o esforço mundial, a vacina chegou mais rápido.
No Brasil, toda a produção das imunizações vem do Instituto Butantan, em São Paulo, que é um laboratório oficial. É dele que virá uma das vacinas contra o coronavírus para os brasileiros, desenvolvida em parceria com a chinesa Sinovac. Recentemente, o Instituto divulgou a eficácia da vacina: 78% para casos leves da doença e 100% para casos graves e moderados. Dados na imprensa sugerem que a eficácia geral de CoronaVac fica abaixo de 60%, mas está dentro do aceitável.
Embora já tenha apresentado um excelente resultado, ao que parece a vacina não chegará de imediato aos braços dos brasileiros. Isso porque o governo Federal ainda não divulgou datas do plano nacional de vacinação. Enquanto a União não fixa um plano específico, a sociedade aciona o STF para que Estados e municípios possam ter seus próprios planos de imunização. O Estado de SP, por exemplo, pretende iniciar a imunização no dia 25 de janeiro. Assim que iniciado o plano, a vacina contra a covid-19 será obrigatória, conforme decidido pelos ministros do Supremo no final de 2020.
*A história é contada no livro “Programa Nacional de Imunizações – 30 anos”, do ministério da Saúde. Clique aqui.