Judiciário
O acusado pode escolher qual pergunta responder em seu interrogatório?
O interrogatório é um dos atos mais importantes do processo penal. Um simples deslize do acusado pode minar a tese defensiva, fazendo ruir toda uma estratégia bem traçada pela defesa, interferindo diretamente na sentença penal que será proferida pelo magistrado.
A Constituição Federal prevê o direito ao silêncio do réu, em seu artigo 5º, inciso LXIII, conforme aqui transcrevemos:
LXIII – o preso será informado de seus direitos, entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado.
O réu tem direito garantido constitucionalmente de permanecer calado sem que isso lhe prejudique no processo criminal que tramita perante a justiça.
Já o artigo 186 do Código de Processo Penal prevê o seguinte:
Art. 186. Depois de devidamente qualificado e cientificado do inteiro teor da acusação, o acusado será informado pelo juiz, antes de iniciar o interrogatório, do seu direito de permanecer calado e de não responder perguntas que lhe forem formuladas.
Frisamos que perguntas referentes “a residência, meios de vida ou profissão, oportunidades sociais, lugar onde exerce a sua atividade, vida pregressa, notadamente se foi preso ou processado alguma vez e, em caso afirmativo, qual o juízo do processo, se houve suspensão condicional ou condenação, qual a pena imposta, se a cumpriu e outros dados familiares e sociais” (artigo 187, § 1º) o acusado deve responder.
Todavia, no que diz respeito ao fato que lhe é imputado, o acusado pode silenciar a qualquer pergunta feira pelo juiz, pelo promotor e inclusive pelo seu defensor.
Assim sendo, não pode o magistrado alegar que a falta de resposta do réu às perguntas por ele feitas não ajudaram a elucidar o fato, porque não é dever do acusado provar sua inocência, mas sim da acusação em provar a culpa do réu, vide artigo 156 do Código de Processo Penal.
Seguindo o Código de Processo Penal, vê-se que o silêncio do acusado não pode ser interpretado ou utilizado contra ele, conforme já mencionado acima.
Para ilustrar, trago o teor do artigo 156, parágrafo único do Código de Processo Penal:
Parágrafo único. O silêncio, que não importará em confissão, não poderá ser interpretado em prejuízo da defesa.
Entretanto, alguns juízes não têm permitido que o acusado possa responder somente às perguntas realizadas por seu advogado, mesmo com o sagrado direito ao silêncio. Ora, é uma questão simples, se o réu pode mentir, silenciar, por qual motivo não poderia responder somente às perguntas que ele bem entender?
É ilógico tal proibição.
Além do direito ao silêncio, faz jus o acusado criminalmente do direito de autodefesa, e, ainda, de não produzir provas contra si mesmo.
Se o acusado pode se defender, bem como não lhe é obrigatório produzir provas contra si, qual o motivo de impedi-lo de responder somente às questões suscitadas pelo seu defensor? Nenhum!!
A defesa, se optar por esse tipo de estratégia e o juiz negar, deve se manifestar imediatamente requerendo nulidade do interrogatório e se o juiz não concordar, deve-se impetrar habeas corpus para o tribunal.
Em recente julgado, uma situação parecida chegou ao STJ, na 5ª Turma, e a ordem de habeas corpus foi concedida, garantindo ao acusado o direito de responder somente ao que for perguntado por seu advogado, consoante apresento:
“Em face das peculiaridades do caso concreto, como dito, o réu acabou por não exercer o seu direito de palavra durante a instrução processual. Portanto, tendo-se como direito do acusado a possibilidade de autodefesa, que não se confunde com o direito ao silêncio e o de não produzir provas contra si mesmo, assim como que a d. Defesa se insurgiu na própria audiência, da mesma forma que a renovação do interrogatório e dos prazos seguintes não trará in casu prejuízo maior à causa do que uma eventual declaração futura de nulidade, tenho que a ordem deva ser concedida. Diante do exposto, não conheço do habeas corpus. Concedo a ordem, de ofício, para que, confirmando a liminar, nova audiência de instrução seja realizada, oportunizando-se, ao paciente, seu interrogatório (a identificação pessoal é obrigatória), assim como se manifestar livremente quanto ao mérito, seja de forma espontânea ou sob condução de perguntas de qualquer das autoridades, especialmente, do seu próprio patrocínio. Por conseguinte, sejam os prazos subsequentes renovados, sem prejuízo da renovação dos eventuais atos já praticados.” (HC 628.224 – STJ – 5ª Turma – julgado em 07/12/2020).
Por fim, já exaustivamente demonstrado, a defesa tem que manifestar primeiramente na própria audiência, requerendo a nulidade do interrogatório caso o juiz não permita que o acusado responda somente às perguntas da defesa e, caso o magistrado mantenha seu posicional, como diria Lucas Sá, HC neles!
Por hoje é isso, pessoal. Espero que tenham gostado.
Forte abraço.
AUTOR:
João Gabriel Desiderato Cavalcante – Advogado Criminalista