Internacional
Em Belarus, não há dilema entre Rússia e Ocidente
Nos protestos contra Lukashenko, não há nenhuma manifestação pró-UE ou Ocidente, como se viu na Ucrânia anos atrás ou na Armênia. Com ou sem o autocrata no poder, Belarus continua pró-Rússia.
Uma olhada no mapa mostra a situação geográfica única de Belarus. A oeste, o país faz fronteira com Polônia, Lituânia e Letônia, membros da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). Ao sul, tem a Ucrânia como vizinha, e ao leste, a Rússia.
Mas Belarus está longe de ser um “Estado-tampão”, diz Gustav Gressel, do Conselho Europeu de Relações Exteriores. E está bem longe de ter qualquer papel de neutralidade, como Suíça, Suécia ou Finlândia.
Belarus faz parte da Organização do Tratado de Segurança Coletiva (CSTO), uma aliança militar de seis países dominada pela Rússia. Criada em 2002, a aliança – que não é tão unida como a Otan – inclui a Armênia e, além de Rússia e Belarus, três repúblicas da Ásia Central: Quirguistão, Tadjiquistão e Cazaquistão.
No último fim de semana, após conversações com o Kremlin, o presidente bielorrusso, Alexander Lukashenko, fez menção à aliança quando disse que a Rússia apoiaria Belarus no âmbito do tratado.
Lukashenko fez o comentário depois de acusar a Otan de colocar tropas na fronteira ocidental de Belarus, uma acusação que a aliança rejeita.
“Permanecemos vigilantes, estritamente defensivos e prontos para impedir qualquer agressão contra os aliados da Otan”, disse o secretário-geral da organização, Jens Stoltenberg, na segunda-feira.
Em resposta, Lukashenko ordenou exercícios militares perto das fronteiras da Lituânia e da Polônia. Para Gressel, trata-se de uma tentativa de criar uma ameaça externa para incentivar uma intervenção militar russa.
“Mas Putin não tem a intenção de fazer isso. Enquanto Belarus não cruzar nenhuma linha vermelha, se manter fiel aos tratados de cooperação econômica e militar, a Rússia não intervirá”, pondera o analista político.
Moscou não necessariamente apoia Lukashenko
De acordo com Gressel e outros especialistas, a Rússia não está depositando suas esperanças em Lukashenko, um autocrata enfraquecido, mas no fato de que Belarus é e continua sendo um país pró-Rússia. Eles acreditam que o Kremlin não se importaria com uma mudança de governo, desde que isso não envolvesse uma guinada em direção ao Ocidente, União Europeia (UE) ou Otan.
E esse não parece ser o objetivo do atual movimento opositor em Belarus. Segundo disse a política opositora bielorrussa Maria Kolesnikova ao jornal alemão Welt am Sonntag, a oposição não sugeriu que Belarus se juntasse à UE. E as sanções de Bruxelas às autoridades bielorrussas, por conta da repressão aos protestos, afirma ela, são contraproducentes, por minarem a possibilidade de diálogo com o governo.
De fato, diplomatas em Bruxelas têm advertido contra dar à Rússia qualquer desculpa para alegar que a UE está interferindo em assuntos bielorrussos. “O povo de Belarus tem o direito de decidir sobre seu futuro e eleger livremente seu líder”, escreveu no Twitter o presidente do Conselho Europeu, Charles Michel, na segunda-feira.
Falando por telefone na terça-feira, a chanceler alemã, Angela Merkel, e o presidente russo, Vladimir Putin, teriam concordado que não deveria haver “nenhuma interferência externa” em Belarus.
Sem paralelos com a Ucrânia
O analista político Gressel chama a atenção que a situação em Belarus não é a mesma da Ucrânia, que, após assumir uma postura pró-Ocidental, teve o território da Crimeia tomado por Putin em 2014. Os bielorrussos tendem a ser pró-Rússia, afirma Gressel, e ambos os países são parte da mesma aliança militar.
Ele diz que a postura de Lukashenko é muito mais problemática. Poucos dias antes das eleições de 9 de agosto, por exemplo, o presidente acusou 32 russos de terem sido pagos para desestabilizar seu país e mandou prendê-los.
Lukashenko nunca concordou com o desejo de Moscou de uma grande base militar russa em Belarus – ele sempre quis a independência total. Ele até forjou laços tímidos com a Otan, participando de vários programas, e ponderou tomar parte em exercícios militares conjuntos. A UE retribuiu, e em 2016 derrubou as sanções que pesavam contra altos dirigentes do governo.
No caso de uma nova eleição, alguns comentaristas suspeitam que o Kremlin contaria com os eleitores para apoiar um novo presidente pró-Rússia. Viktor Babariko, preso em maio por lavagem de dinheiro e acusações de evasão fiscal, se encaixaria nessa descrição. Babariko, que dirige uma subsidiária bielorrussa da Gazprom, nega as acusações que enfrenta e defende a independência bielorrussa frente ao Ocidente e à Rússia.
A Ucrânia não é uma boa comparação. Mas e a Armênia, onde o chefe de governo pró-Rússia foi substituído por um político mais orientado para o Ocidente na Revolução de Veludo de 2018?
Hoje, a Armênia está longe de se retirar da aliança econômica e do tratado militar com a Rússia. E o premiê Nikol Pashinyan, antes líder do movimento de protesto, é visto como um dos aliados mais próximos de Putin no exterior.