Esporte
O único ano em que a Olimpíada foi privatizada – e foi um sucesso financeiro
No Brasil, foram lucros privados e prejuízos socializados
Como todos já sabem, a Olimpíada é um evento financiado, em grande medida, pelos governos do país-sede — ou seja, pelos pagadores de impostos, queiram eles ou não.
Embora alguns países tenham programas de voluntariado e façam arrecadações voluntárias para bancar alguns atletas, o fato é que boa parte do financiamento vem do governo. O governo normalmente constrói os estádios e as demais instalações necessárias para sediar o evento. E, alguns casos, chega a arcar com a maior fatia do financiamento.
Mas nem sempre foi assim.
Quando chegou a época de as cidades ao redor do globo apresentarem sua candidatura para sediar a Olimpíada de 1984, ninguém se voluntariou. À época, sediar os jogos olímpicos era visto como o que realmente são: um risco financeiro.
Após ter sediado a Olimpíada de 1976, a cidade de Montreal se viu com uma dívida de US$ 1,5 bilhão. Os jogos foram um desastre financeiro para a cidade, a qual só conseguiu finalmente quitar toda a dívida no ano de 2006.
Para agravar os ânimos, os jogos olímpicos de Moscou, em 1980, também foram outro desastre financeiro.
Os pagadores de impostos impõem o limite
Afetada pelo desastre financeiro ocorrido em Montreal e ainda tendo de lidar com a turbulência e a agitação política da Guerra Fria, a Olimpíada de 1984 não se mostrou exatamente muito popular em termos de atrair cidades-sede. Com efeito, no último minuto, apenas duas cidades haviam oficialmente se candidatado: Nova York e Los Angeles.
Los Angeles acabou vencendo a disputa, mas seus cidadãos não estavam nada entusiasmados com essa vitória. Tampouco estavam dispostos a bancar toda a festa. Eles estavam tão inflexíveis em seu propósito de proteger seus dólares de impostos contra qualquer gasto esbanjador, que conseguiram aprovar um projeto de lei proibindo o uso de dinheiro público para construir as instalações olímpicas.
Consequentemente, a cidade tinha agora a honra de sediar os jogos olímpicos, mas não tinha como pagar.
Felizmente, um empreendedor local chamado Peter Ueberroth — que tinha a fama de ser extremamente competente em lidar com orçamentos apertados — entrou em cena e assumiu a iniciativa do Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Los Angeles (LA84).
Formado por outros empresários de sucesso, bem como por indivíduos sagazes e de mentalidade empreendedora, o objetivo do Comitê era simples: encontrar financiamento privado para a Olimpíada, uma façanha que até então jamais havia sido feito.
De início, os críticos e os céticos não gostaram nada da ideia de deixar o destino dos jogos olímpicos de 1984 nas mãos de um comitê formado por executivos do setor privado. Mas acabaram se dobrando aos fatos.
Com bem resume esse verbete da Wikipedia:
O Comitê Organizador dos Jogos Olímpicos de Los Angeles (LA84) deixou claro ao Comitê Olímpico Internacional (COI) que a cidade não arcaria com nenhum eventual custo adicional e que as instalações esportivas já existentes seriam as mais utilizadas, em particular o Los Angeles Memorial Coliseum, que havia sido construído para as Olimpíadas de 1932 (outra época em que ninguém queria sediar os jogos).
O Velódromo Olímpico e o Estádio Olímpico de Natação, financiados pela McDonald’s e pela 7-Eleven respectivamente, foram as únicas duas instalações construídas especificamente para os jogos olímpicos.
Os baixos custos de construção, em conjunto com a forte dependência de financiamento privado, permitiram aos jogos gerar um lucro de mais de US$ 200 milhões à época (equivalentes a US$ 522 milhões hoje, ou mais de R$ 2,7 bilhões de reais), fazendo daqueles jogos olímpicos, de longe, os mais financeiramente bem-sucedidos da história.
Ao final, portanto, não apenas o Comitê gastou menos do que o previsto, como ainda conseguiu ter um lucro substantivo — e ter algum lucro era algo que, até então, só havia acontecido uma vez na história.
Por meio de arrecadações privadas, patrocínios de empresas, e muita disciplina fiscal, o Comitê conseguiu realizar o impensável. Em vez de esbanjar milhões, se não bilhões, na construção de novas instalações, o LA84 simplesmente utilizou arenas e instalações universitárias que já existiam.
Também algo inédito à época, o Comitê fez história ao vender os direitos exclusivos de transmissão para apenas uma rede de televisão. A American Broadcasting Company (ABC) pagou a modesta quantia de US$ 225 milhões para ser a única fonte de transmissão, dentro dos EUA, dos jogos olímpicos.
Para alojar os atletas, o LA84 optou por utilizar os dormitórios das faculdades e universidades, bem como todos os outros tipos de alojamentos espalhados pela cidade, em vez de construir uma faustosa e custosa “Vila Olímpica”, algo que se tornou tradição nas outras cidades-sede.
No final, os jogos olímpicos de Los Angeles, de 1984, tiveram um custo total de US$ 546 milhões. Quando comparado aos US$ 50 bilhões gastos em 2013 nos jogos olímpicos de inverno em Sochi, a quantia gasta pelo LA84 parece praticamente irrisória.
Conclusão
O fato é que as olimpíadas são um grande negócio. Os direitos de transmissão são extremamente caros e muito demandados. As receitas de turismo na cidade-sede são enormes, bem como as vendas de ingressos para os eventos.
De resto, o Comitê Olímpico Internacional (COI) é uma organização internacional, não-governamental e sem fins lucrativos localizada na Suíça. Logo, não há absolutamente nenhum motivo para governos se envolverem e terem de utilizar dinheiro de impostos para bancar as olimpíadas. Um evento capaz de gerar todo esse volume de receitas pode ser perfeitamente organizado por um conglomerado de empreendedores em busca do lucro. Não apenas tragédias financeiras como Montreal e Moscou [e, agora, Brasil] teriam sido evitadas, como também uma tremenda eficiência de custos teria sido realizada.
E, embora não seja de todo o correto dizer que os jogos olímpicos de 1984 foram um empreendimento 100% privado (houve algum auxílio do governo federal), a Olimpíada daquele ano mostrou ao mundo que, no que diz respeito a sediar olimpíadas, a privatização não só é possível, como também é a maneira mais eficiente de fazer o serviço.
Fonte: Mises Brasil