Internacional
Clube techno Berghain volta a abrir em Berlim
Após 19 meses, a cultuada casa de festas berlinense promove sua “Klubnacht”. Controle de vacinação é novidade, mas permanecem as já icônicas filas e a incerteza de conseguir entrar – tudo depende dos seguranças
O Berghain é um dos clubes mais famosos do mundo: um monolítico edifício neoclássico plantado num enorme terreno no bairro berlinense de Friedrichshain. A locação perfeita para grandes festas, pois à volta não há ninguém morando.
Desde 2004, a antiga usina termelétrica de Berlim Oriental é objeto de desejo de festeiros de todo o mundo. O local é uma continuação da história dos tecnho-clubs da metrópole alemã, começada no início da década de 1990 em numerosos porões e prédios de fábricas abandonados. A trilha sonora dos eventos era forte, selvagem e fazia suar: techno-house.
A danceteria mais famosa da época era a Tresor, um edifício solitário em meio à praça Potsdamer Platz, então deserta, na terra-de-ninguém entre o velho Oeste e o velho Leste, um porão do banco da loja de departamentos Wertheim, com escaninhos enferrujados, grades, uma implacável tempestade de luz estroboscópica e beats igualmente implacáveis.
Aqui nasceu o mito techno de Berlim. Também estabelecimentos como o Bunker ou o Eimer fazem parte dessa história. Muitos não sobreviveram à virada do século. Um deles, porém, resistiu: fundado em 1999, o Ostgut é considerado precursor do Berghain. Aqui a vida noturna berlinense culminava em festas homéricas onde se celebrava a liberdade – também sexual – sem limites.
Em 2003 o Ostgut teve que dar lugar a uma arena multiusos. Os proprietários procuraram um outro prédio, e no ano seguinte fundavam o Berghain, que logo ficou conhecido em todo mundo e ganhou status de culto.
O mistério dos leões-de-chácara
Quem quer entrar tem que esperar horas na fila. Quem pode entrar, é um mistério insondável. Os seguranças do Berghain são imprevisíveis, diz-se que é “a porta mais dura de Berlim”. A supervisão fica a cargo de Sven Marquardt, tatuado e cheio de piercings, e “nas horas vagas”, fotógrafo de sucesso.
Entrevistado incontáveis vezes, esse homem não solta nenhum segredo, permanece impenetrável – como a sua porta. Em blogs e artigos, não faltou quem especulasse sobre o que fazer para ser admitido no clube: usar preto? Meias arrastão? Ficar tranquilão? Não sorrir demais? Óculos de sol? Saltos altos ou sneakers? Só, a dois ou em grupo? Gay, lésbica, queer ou hétero?
Não existe receita segura para entrar, mas muitas para não entrar. Apesar de louvado em tantos folhetos turísticos como hotspot da capital alemã, o Berghain não tem lugar para o turista normal, que só quer dar uma olhadinha. Discutir com o leão-de-chácara ou se queixar é inútil.
O que acontece no Berghain, fica no Berghain
Despedidas de solteiro estão fora de cogitação, assim como clubinhos de boliche e outros grupos loucos por uma bagunça, que já se embriagam na fila e ficam cantando músicas de torcida. O Berghain não é nem o Ballermann – a casa de festas na ilha de Maiorca tão apreciada pelos festeiros alemães – nem o zoológico, mas um clube underground, e assim quer permanecer.
Não é permitido tirar fotos: na entrada, as câmeras dos celulares são tapadas com fita adesiva. Quem ainda assim é apanhado fotografando, leva uma bronca enorme e é posto para fora. Pois, fora tirar fotos, é permitido tudo, e todo mundo deve se sentir livre e não observado.
Há diversas pistas de dança em espaços variados, onde os frequentadores podem “soltar a franga” à vontade. Ao Berghain não se vai apenas para dançar, lá se pode simplesmente “ser”, mesmo que seja extremamente excêntrico e “especial”.
Quanto às incontáveis lendas de orgias desbragadas e consumo desenfreado de drogas: há um pouco de verdade nelas. O que acontece, acontece – e não sai das muitas paredes do Berghain. Não é de espantar que ele seja tão cobiçado.
Arte contemporânea contra a pandemia
Quando, no início da pandemia de covid-19, o Berghain teve que fazer uma pausa, os donos pensaram – assim como muitos outros do setor – que a coisa ia se ajeitar. Ledo engano: os clubes permaneceram fechados, nada restou, senão engolir em seco e acatar as ordens superiores.
À procura de alternativas na crise sanitário-financeira, os promotores da casa cult se associaram a Christian e Karen Boros, proprietários de uma coleção privada de arte contemporânea no antigo Bunker techno. Juntos, eles organizaram uma exposição no Berghain.
E assim, em setembro de 2020, o icônico clube abriu suas portas – normalmente inexpugnáveis – para os amantes da arte: a mostra coletiva Studio Berlim apresentou 115 artistas da capital sem outras possibilidades de divulgar sua obra, devido à pandemia.
Berghain em ritmo de coronavírus: a fila fica
Para o público dançante, o terreno do Berghain está acessível já há algumas semanas, com seu “Diskogarten” a céu aberto – já que desde o verão Berlim flexibilizou as restrições contra o coronavírus. E partir deste sábado (02/10), depois de 19 meses, passam a ser permitidas também festas em seus espaços fechados – tudo dentro das atuais regras antipandemia, claro.
As primeiras “Klubnächte” no Panorama-Bar estão programadas para os cinco fins de semana de outubro. Elas começam sempre às 23:59, só sendo admitidos vacinados ou recuperados da covid-19. Não há obrigatoriedade de máscara protetora.
Uma coisa não mudou: como não é possível reservar ingressos online, todos deverão se munir de bastante paciência e fazer fila. Além da usual vistoria de rostos e indumentárias, serão fiscalizados também os certificados digitais de vacinação.
Uma dica: não desanimar se o segurança não deixar passar, simplesmente tentar de novo. E, quem sabe, de novo.