Judiciário
Webinar discute importância e impacto de lei para a proteção de mulheres durante a pandemia
A importância e o impacto da Lei 14.022/2020 para a proteção de mulheres vítimas de violência doméstica e familiar durante a pandemia da covid-19 foram discutidas na tarde dessa quarta-feira (9/09) no webinar promovido pelo Núcleo Estadual de Gênero do Ministério Público da Paraíba (MPPB), com o apoio do Centro de Estudos e Aperfeiçoamento Funcional (Ceaf). Participaram do evento promotores de Justiça que atuam nas áreas da família e cidadania, a servidores e assessores do MPPB, além de profissionais com interesse no assunto.
O webinar foi aberto pelo coordenador do Núcleo Estadual de Gênero, o procurador de Justiça Valberto Lira, que destacou a importância de uma análise mais aprofundada sobre uma lei tão recente. “Vamos pedir a colaboração de quem sabe da matéria para que possamos aprender com quem tem expertise no assunto”, disse, referindo-se às palestrantes.
A promotora de Justiça e integrante do Núcleo Estadual de Gênero do MPPB, Caroline Freire, atuou como mediadora do evento e debatedora. Ela esclareceu que a Lei 14.022/2020 dispõe sobre medidas de enfrentamento à violência contra a mulher, crianças, idosos e pessoas com deficiência.
“A efetividade da lei depende da nossa atuação”
A primeira palestra do webinar foi proferida pela juíza de Minas Gerais, Bárbara Lívio. Ela falou sobre o impacto da pandemia no fenômeno da violência doméstica e familiar (apresentando fatores como aumento do estresse e a crise e a dificuldade financeira enquanto fatores de risco) e nos serviços de promoção e fortalecimento de vínculos oferecidos pelo poder público, bem como a dificuldade de formas de acesso das vítimas à proteção do Estado.
Segundo a magistrada, a efetividade da nova lei depende da atuação dos atores e instituições do sistema de Justiça.
Ela explicou que a Lei 14.022/20 prevê como regra o atendimento preferencialmente presencial, adotadas as medidas e protocolos sanitários, às mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiência e também inovou ao criar as equipes móveis para atendimento das vítimas de violência. “É o Estado indo até as pessoas”, disse.
Também falou sobre a importância dos serviços prestados pelos Cras e Creas às vítimas nos municípios, da possibilidade de admissão de laudos e prontuários médicos como meios de prova e sobre o atendimento virtual, via canais com interação simultânea e compartilhamento de documentos, enfatizando que é preciso garantir a efetividade dos instrumentos eletrônicos. “A delegacia virtual salva vidas!”, destacou.
Outros assuntos discutidos por ela foram as medidas protetivas previstas na nova lei, que garante o pedido, o deferimento e a intimação possam ser realizadas de forma online por tempo indeterminado, enquanto a Lei 13.979/20 estiver em vigor ou enquanto durar o estado de emergência de caráter humanitário e sanitário.
Um dos pontos controversos da lei apresentados pela magistrada foi em relação à obrigatoriedade do processo criminal. Isso porque, conforme ela explicou, esse novo instituto jurídico prevê que, quando a medida protetiva é pedida pela internet ou por telefone, a delegacia deve instaurar o inquérito policial, independente da autorização da ofendida.
Foco na manutenção dos atendimentos e na desburocratização processual
A segunda palestra foi proferida pela promotora de Justiça da Bahia, Sara Gama, que discutiu o impacto da nova lei na proteção às mulheres vítimas de violência doméstica, um fenômeno multicausal e complexo. Segundo ela, o foco da Lei 14.022/20 é a manutenção dos atendimentos às mulheres, crianças, idosos e pessoas com deficiência vítimas de violência e a desburocratização dos atos processuais.
Durante a apresentação, a representante do MPBA apresentou dados estatísticos nacionais sobre o fenômeno da violência contra a mulher. De acordo com as estatísticas de 2019, a cada ano 66 mil mulheres são estupradas no Brasil; a cada dia, 13 são assassinadas e a cada hora, 536 são agredidas.
Sara lembrou que, somente em 2004, o Código Penal brasileiro passou a prever como crime a violência doméstica, que gera problemas gravíssimos na família inteira, inclusive em crianças e destacou a Lei Maria da Penha e a Lei do Feminicídio como “marcos civilizatórios”, discutiu a importância da Lei 13.984/20 (que prevê a inserção dos agressores em grupos reflexivos, como medida protetiva) e outras alterações legislativas recentes.
Importância da rede de apoio
Também lamentou o fato de a Lei Maria da Penha, que completou 14 anos, não ter sido ainda completamente efetivada. “Qualquer dificuldade financeira, qualquer crise repercute na diminuição dos direitos das mulheres, no fomento de políticas públicas e dos serviços voltados às mulheres. Falta colocar a pauta da violência contra a mulher como prioridade”, criticou.
A última palestra foi ministrada pela psicóloga e ex-secretária de Políticas Públicas para Mulheres do Estado da Paraíba, Gilberta Soares. Ela fez uma abordagem psicossocial do fenômeno da violência doméstica e familiar durante a pandemia da covid-19, destacando o problema como questão de saúde pública.
Segundo Gilberta, a violência contra a mulher deve ser discutida enquanto uso da força física e de poder, resultante de uma cultura machista e sexista, que também foi impactada em razão da pandemia. “O isolamento, o cerceamento das mulheres com seus familiares, a dificuldade de acesso aos serviços, inclusive por conta da limitação da locomoção, o uso de álcool e drogas, a diminuição da renda que ameaça o sustento da família surgem como fatores de risco para tensionar as relações familiares. No início da pandemia, houve uma diminuição no número de registro da violência, com o alerta de que isso não significava a ausência do fenômeno. Com o surgimento dos canais eletrônicos e da Delegacia Online, aumento o número de registro de casos”, disse.
A ex-secretária estadual destacou a importância da rede de apoio às vítimas de violência doméstica e familiar, da presença de profissionais de psicologia e assistência social para fazer a escuta dessas pessoas, encorajando-as a romper com o ciclo da violência e defendeu que para que a Lei 14.022/20 seja aplicada, “é preciso recurso orçamentário e é fundamental o fortalecimento das políticas públicas voltadas às mulheres”.