Internacional
Busca por sobreviventes segue em Beirute, que tem até 300 mil desabrigados
Explosão destruiu parte da cidade e matou pelo menos 100 pessoas; Toneladas de nitrato de amônia estavam armazenadas há 6 anos no porto sem medidas de segurança.
Equipes de resgate libanesas cavavam nos destroços de prédios nesta quarta-feira (5) em busca de sobreviventes, após uma grande explosão em um armazém no porto de Beirute causar pelo menos 100 mortes e deixar mais de 4.000 pessoas feridas.
Autoridades disseram que a contagem deve aumentar após a explosão de terça-feira em um armazém portuário que guardava materiais altamente explosivos.
O governador de Beirute, Marwan Abboud, disse que até 300 mil pessoas podem ter ficado desabrigadas. A região metropolitana tem 4 milhões de habitantes.
A explosão foi a mais poderosa a atingir Beirute, uma cidade ainda com cicatrizes da guerra civil de três décadas atrás, e impactada por um derretimento econômico e por um aumento de casos de coronavírus.
Antes e depois da explosão no porto de Beirute.
A explosão jogou uma nuvem de fumaça no céu e chacoalhou janelas na ilha mediterrânea do Chipre, a aproximadamente 160 quilômetros de distância.
O presidente do Líbano, Michel Aoun, disse que 2.750 toneladas de nitrato de amônia, usado em fertilizantes e bombas, estavam armazenadas há seis anos no porto, sem medidas de segurança.
Ele afirmou para a população que o governo está “determinado a investigar e expor o que aconteceu assim que possível, além de responsabilizar os culpados e negligentes, impondo a eles a punição mais severa”.
Uma autoridade com conhecimento das investigações preliminares citou negligência como causa do incidente. Libaneses comuns culparam os políticos, que supervisionaram décadas de corrupção estatal e má gestão que levou o Líbano a uma crise financeira.
“Esta é um catástrofe para Beirute e para o Líbano”, disse o prefeito de Beirute, Jamal Itani, à Reuters, enquanto inspecionava danos que ele estima estarem na casa dos bilhões de dólares.
O chefe da Cruz Vermelha do Líbano, George Kettani, disse que pelo menos 100 pessoas morreram. “Ainda estamos vasculhando a área. Ainda pode haver mais vítimas. Espero que não”, disse.
A intensidade da explosão atirou três vítimas ao mar e equipes de resgate estavam tentando recuperar corpos. Muitos dos mortos eram funcionários do porto e da alfândega e pessoas trabalhando na área ou passando de carro durante a hora do rush de terça-feira.
A Cruz Vermelha estava em coordenação com o Ministério da Saúde para organizar os necrotérios, e os hospitais estavam sobrecarregados, disse Kettani.
“Golpe fatal”
Fachadas de prédios no centro de Beirute foram destruídas, móveis foram atirados às ruas, que ficaram cheias de vidro e detritos. Carros perto do porto capotaram.
“Esse é o golpe fatal em Beirute. Somos uma área de desastre. Meu prédio estremeceu. Eu achei que era um terremoto”, disse Bilal, homem na casa dos 60 anos, no centro da cidade.
Como outros, ele culpou a elite política. “Já temos uma crise econômica, as pessoas estão com fome, e esses ladrões, eles vão nos compensar pelas perdas? Quem compensará aqueles que perderam entes queridos?”, disse.
Outros países têm oferecido apoio. Estados do Golfo Árabe, que no passado foram grandes financiadores do Líbano, mas recentemente recuaram pelo que dizem ser interferência do Irã no país, enviaram aviões com equipamentos médicos e outros suprimentos. O Irã ofereceu comida e um hospital de campanha, disse a agência de notícias Isna.
Estados Unidos, Reino Unido, França e outras nações ocidentais, que vêm exigindo mudanças políticas no Líbano, também ofereceram ajuda. A Holanda disse que enviaria médicos, enfermeiros e equipes de busca especializada e resgate.
“Essa explosão sela o colapso do Líbano. Eu realmente culpo a classe governante”, disse Hassan Zaiter, 32, gerente do muito danificado Le Gray Hotel, no centro de Beirute.
Para muitos, foi uma dolorosa lembrança da guerra civil entre 1975 e 1990 que rasgou a nação em duas e destruiu faixas de Beirute, muitas das quais foram reconstruídas. A reconstrução pós-guerra e a corrupção política atolaram o Líbano em dívidas gigantescas.
Impacto sobre alimentos
O principal silo de armazenamento de grãos do Líbano, no porto de Beirute, foi destruído na explosão, o que deixa o país com menos de um mês em reservas de grãos, embora ainda haja farinha suficiente para evitar uma crise, disse o ministro da economia, Raoul Nehme, nesta quarta-feira.
Segundo ele, o Líbano precisa de reservas para ao menos três meses para garantir a segurança alimentar e estava olhando outras áreas para armazenamento.
A explosão foi a mais forte que já atingiu Beirute. A economia já estava desabando antes do incidente, com importações de grãos desacelerando à medida que o país enfrentava dificuldades para obter moeda forte para as compras.
“Não há crise de pão ou farinha”, disse o ministro. “Nós temos estoques suficientes e barcos a caminho para cobrir as necessidades do Líbano no longo prazo”.
Ele afirmou que as reservas de grãos nos silos restantes do Líbano são suficientes para “pouco menos de um mês”, mas disse que o silo destruído estava com apenas 15 mil toneladas em grãos, muito menos que sua capacidade, que um oficial descreveu como de 120 mil toneladas.
O distrito portuário de Beirute foi destruído pela explosão, o que desativou o principal ponto de entrada para importações que alimentam uma nação com mais de 6 milhões de pessoas.
Ahmed Tamer, diretor do porto de Trípoli, a segunda maior instalação do Líbano, disse que seu porto não possui armazenamento de grãos, mas as cargas podem ser levadas para armazéns a 2 km de distância.
“Tememos que haja um enorme problema na cadeia de suprimento, a menos que haja um consenso internacional para nos salvar”, disse Hani Bohsali, chefe de um sindicato de importadores.
Agências da ONU estão reunidas nesta quarta-feira para coordenar esforços de socorro a Beirute, disse Tamara al-Rifai, porta-voz da agência de assistência aos refugiados palestinos, UNRWA.
“As pessoas são extremamente pobres, é cada vez mais difícil para qualquer um comprar comida, e o fato de Beirute ser o maior porto do Líbano torna a situação muito ruim”, disse ela. “Estamos olhando para Trípoli, mas é um porto muito menor”.
As reservas de farinha eram suficientes para cobrir as necessidades do mercado por um mês e meio e havia quatro navios transportando 28.000 toneladas de trigo em direção ao Líbano, disse Ahmed Hattit, chefe do sindicato dos importadores de trigo, ao jornal Al-Akhbar.
O Líbano está tentando transferir imediatamente para o porto de Trípoli quatro navios que transportam 25.000 toneladas de farinha, disse um representante do governo ao canal de notícias LBCI.