Nacional
Por que a vitória do governo na Câmara não sinaliza apoio à agenda de Paulo Guedes
Deputados e senadores que costumam votar seguindo orientação de Bolsonaro enviaram recado de que esperam cumprimento de compromissos de olho nas eleições.
Em sua primeira prova de fidelidade, a “nova base” do governo federal garantiu a manutenção do veto ao dispositivo que possibilitava concessão de reajuste salarial a algumas carreiras do funcionalismo públicos em 2021. A vitória na Câmara após derrota no Senado, no entanto, não sinaliza apoio à agenda do ministro da Economia, Paulo Guedes.
Deputados e, principalmente, senadores que costumam votar seguindo orientação do presidente Jair Bolsonaro enviaram um recado ao governo de que esperam o cumprimento de compromissos de olho nas eleições deste ano e de 2022.
No Senado, a rusga é ainda maior por causa da declaração do ministro após a derrubada do veto. Surpreendido com o resultado da votação, Paulo Guedes disparou contra os senadores. Disse que eles cometiam “um crime contra o País” e que era “um péssimo sinal”. “O Senado deu um sinal muito ruim permitindo que os recursos que foram para a crise da saúde possam se transformar em aumento de salário”, afirmou o ministro.
As falas fizeram com que os senadores articulassem um requerimento para chamar o ministro a dar explicações. Nesta sexta-feira (21), o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), apresentou um requerimento de convite para que o ministro se explique. Autor de outro requerimento com o mesmo objetivo, o líder do PP, senador Esperidão Amin (SC), quer também que Guedes detalhe a conta de que o reajuste poderia causar um rombo de até R$ 120 bilhões no orçamento do governo.
O embate com os senadores só piora a situação do ministro, que está em um de seus momentos mais frágeis no governo. As principais promessas de campanha de Bolsonaro para a economia vêm enfrentando resistências dentro do próprio governo. O Ministério da Economia não conseguiu enviar reformas robustas ao governo e nem mesmo tirar do papel o cronograma de privatizações. Esses impasses culminaram na semana passada na saída de dois secretários da pasta.
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Esses dois integrantes se somam a outros cinco que ao longo desses 18 meses de governo se frustaram por não conseguir tocar seus projetos e deixaram a pasta. Neste cenário, a briga com o Senado significa mais uma barreira para a aprovação dessas propostas. Além de as medidas serem impopulares, como a reforma administrativa que mexe na carreira do servidor, elas precisam de apoio dos parlamentares para serem implementadas.
A curto prazo, o ministro depende do Senado para aprovar propostas como as de emenda à Constituição do pacto federativo e a dos gatilhos. As duas são consideradas pela equipe econômicas essenciais para aliviar as contas públicas. A PEC dos gatilhos, por exemplo, permite que o governo acione alguns mecanismos, caso não consiga cumprir a “regra de ouro”. Essa regra o proíbe de fazer dívida para pagar despesas correntes, como salários e aposentadorias. E a PEC permite abrir espaço no orçamento.
Para se ter uma ideia da dimensão, nessa época do ano passado, o presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ) estimou que o orçamento deste ano teria capacidade para investimento (o que “sobra” além do gasto obrigatório) de R$ 35 bilhões. Já essa PEC, segundo estudo do IFI (Instituto Fiscal Independente), tem potencial para abrir um espaço de R$ 40 bilhões no orçamento em 2021 e 2022.
A expectativa é que essa proposta seja fundida à do pacto federativo e outras sugestões do governo. Há ainda a PEC dos Fundos Públicos e a que prevê a extinção de fundos. À Reuters, o líder do governo do Senado, Fernando Bezerra Coelho (MDB-PE), admite esse novo texto poderá “oferecer resistência política tendo em vista a proximidade da eleição”.
O presidente do Senado, por exemplo, não tem feitos esforços para acelerar a tramitação das propostas da agenda econômica. Em março, o ministro enviou um ofício ao presidente da Casa pedindo agilidade, mas os projetos estão com a tramitação praticamente congelada.
Ciente da dificuldade no Congresso, o próprio líder do governo também reconhece a possibilidade de o Executivo enviar a medida impopular acompanhada de um texto que agrade os colegas. Ainda à Reuters, ele ponderou que “o gatilho poderá estar casado com o programa denominado Renda Brasil, que é o programa de solidariedade social que vai representar um grande avanço em relação ao Bolsa Família”.
Parlamentares que estão de olho nas eleições apostam no Renda Brasil tanto pela popularidade de Bolsonaro, que poderia transferir votos, quanto pela possibilidade de reivindicar a paternidade ― à espera de um efeito semelhante ao que o Bolsa Família atrelou ao PT. Eles também contam que o governo cumprirá a promessa de investir em obras. Essas ideia que acenam positivamente aos políticos desagradam o ministro da Economia, por criar novas contas, em um momento em que ele busca onde cortar gastos.
Além do Congresso, onde existem iniciativas de vários parlamentares no sentido de estender o estado de calamidade ou flexibilizar metas fiscais, a pressão vem de integrantes do governo federal. O ministro do Desenvolvimento Regional, Rogério Marinho, chegou a enviar consulta ao TCU (Tribunal de Contas da União) sobre a possibilidade de usar créditos extraordinários para financiar obras.
Ele desistiu da consulta, mas não abandonou o discurso de usar esses empreendimentos para impulsionar a retomada da economia no pós-pandemia. A ideia tem sido abafada, mas nos bastidores a informação é que há uma busca por espaço no orçamento para financiar essas propostas.
A votação dos vetos
Apesar da vertente que caminha em sentido oposto à do ministro Paulo Guedes, a agenda econômica reconquistou um aliado: Rodrigo Maia. O presidente da Câmara foi um dos principais articuladores da votação que manteve o veto ao reajuste de servidores.
Os que defendiam a derrubada do veto argumentavam que o texto impede que estados e municípios concedam qualquer tipo de reajuste ou rerratificação aos servidores que estão na linha de frente do combate ao coronavírus.
Líder do PSB na Casa, o deputado Alessandro Molon (RJ) enfatizou que derrubar o veto não significa imediatamente conceder aumento. “Quem votar a favor do veto estará votando contra qualquer gratificação para profissional de saúde que está lá no front para socorrer sua família e a todos nós”, disse.
Rodrigo Maia, que liderou uma série de reuniões ao longo do dia junto com caciques do Centrão, reconheceu a justificativa do colega, mas afirmou que votar contra o veto significa falta de compromisso com as contas públicas e com o funcionamento da máquina.
“Estamos trabalhando para que a gente consiga na tarde de hoje manter o veto. Não tem nada contra o servidor”, disse. “Não dá para que o setor público não dê sua contribuição”, pontuou.
Após a votação, Maia enalteceu os colegas e minimizou a articulação liderada pelo Planalto. “Não tirando a importância do governo, mas foram os líderes da Câmara que construíram a solução”, disse. Nesta sexta, Bolsonaro agradeceu aos deputados. “Podem ter certeza, com o time que nós temos, com os nossos sócios, no bom sentido, no Parlamento brasileiro, nós atingiremos os nossos objetivos”, disse.
No Senado, o argumento de aliados de Bolsonaro para votar contra indicação do presidente foi semelhante ao de Molon. Além dos profissionais de saúde, o dispositivo previa possibilidade de aumento para outras categorias como professores e policiais. São classes que compõem a base de senadores como Izalci Lucas (PSDB-DF), vice-líder do governo, e Major Olímpio (PSL-SL), que já foi um dos principais soldados do presidente.
“Em todos os países do mundo quem está na guerra é condecorado. Nós estamos tirando [direitos]”, disse Major Olimpio.