Judiciário
O acordo de colaboração premiada e o pacote anticrime
Conceito, requisitos, aplicabilidade, benefícios e finalidade previstos no ordenamento jurídico e sua função social
Este acordo, e sua previsão em algumas legislações especiais, nos traz alguns detalhes imprescindíveis acerca da sua aplicabilidade, a qual deverá ocorrer da forma benéfica, dentro dos limites legais, atendendo aos seus requisitos e ao interesse público social, a fim de atingir sua finalidade de evitar a propagação de mais condutas criminosas.
O conceito do acordo de colaboração premiada está previsto no art. 3º-A da Lei de Organizações Criminosas (12.850/2013):
“O acordo de colaboração premiada é negócio jurídico processual e meio de obtenção de prova, que pressupõe utilidade e interesse públicos.”
Colaboração x Delação
Há algumas confusões e discussões acerca dos termos colaboração e delação, entretanto, com o advento da atual legislação vigente com o pacote anticrime, é importante frisar que os dois se complementam, de modo que a delação está ligada ao ato de cooperação em si, a renúncia do direito ao silêncio, enquanto a colaboração é mais abrangente e está ligada ao negócio jurídico processual que deverá ser celebrado entre o agente e o Estado.
Vale ressaltar uma opinião contrária ao instituto da delação, o jurista Guilherme de Souza Nucci critica e aponta ser imoral, apesar de ser um mal necessário, visto que é um meio eficaz perante a letargia do Estado no combate a criminalidade organizada.
Legitimidade e competência
As autoridades legitimadas para conduzir o acordo são Delegado de Polícia e membro do Ministério Público, isso inclui elaborar, negociar, discutir termos e benefícios. Contudo, o acordo, quando reduzido a termo e juntado aos autos, será submetido à homologação pelo juiz. É importante frisar que o juiz não participa das negociações, mas tem o controle dos termos podendo recusá-los quando não atender aos requisitos legais, devolvendo às partes para a readequação. Quanto à competência do juiz, o art. 3º-B, XVII do Código de Processo Penal remete tal atribuição ao juiz das garantias, porém, há também o informativo de nº 895 do STF (segunda turma) e estende essa competência aos tribunais também.
Requisitos e pressupostos
Para firmar um acordo de colaboração premiada é necessário o conhecimento acerca de alguns requisitos e pressupostos, os quais são exigidos pela lei que o regulamenta.
Pois bem, todo procedimento deverá ser norteado pela voluntariedade das partes, logo, ameaça, coação ou chantagem consistem em prova ilícita, com isso, não se deve confundir com a renúncia ao silêncio e autoincriminação, pois este acordo implica no rompimento desses direitos por escolha do colaborador. Ademais, a eficácia dos fatos e provas fornecidas é imprescindível, assim como as circunstâncias deverão ser favoráveis para a resolução do caso.
Procedimento e aplicabilidade
Há uma previsão legal de conduta a ser seguida, mas como se trata de discricionariedade, as autoridades devem agir da melhor forma, dentro dos limites legais, para melhor atender o interesse público social.
Primeiramente, existem prerrogativas que devem ser analisadas, como a proporcionalidade e congruência do benefício em relação à gravidade e circunstâncias das infrações, assim como a periculosidade do colaborador, a boa-fé. Normalmente, essa fase inicial acontece de maneira informal, pois há apenas a apresentação de proposta e uma discussão dos termos antes do acordo de fato, entretanto, as tratativas já se submetem à confidencialidade, de modo que o delegado ou promotor não poderão utilizar as informações discutidas para nenhuma finalidade.
Por conseguinte, ocorre a negativa ou concordância do acordo. Se negado, a autoridade competente deverá elaborar uma justificativa, dando ciência da negativa e comprometendo-se em não usar nenhuma informação revelada entre eles dentro do processo, pois configuraria prova ilícita. Se aceita, haverá a assinatura, por ambas as partes, de um termo de confidencialidade, o qual submeterá o acordo e todas as tratativas seguintes ao sigilo, este não poderá ser quebrado até o recebimento da denúncia ou queixa-crime.
O acordo e suas tratativas serão oficializados por meio de gravações, preferencialmente audiovisuais por passarem uma maior fidelidade, e as cópias serão garantidas para ambas as partes. Além disso, deverá ser procedida por meio da instrução de autoridade competente, o qual conduzirá do início ao fim, garantindo suprir, caso haja, a necessidade de complementação ou confirmação dos fatos ilícitos, provas indicadas ou elementos de corroboração relevantes, ainda deverão concorrer ou ter relação direta com os investigados e envolvidos do caso.
Por fim, o acordo de colaboração tem natureza de negócio jurídico, portanto poderá sofrer rescisão, isto é, há a possibilidade de cancelamento pela omissão de informações ou fatos importantes, além da cassação dos benefícios concedidos aos delatores, total ou parcial.
Previsão nas legislações especiais
O acordo de colaboração premiada tem previsão no art. 159, § 4º, do Código Penal — extorsão mediante sequestro; art. 25, § 2º, da Lei n. 7.492/86 — crimes contra o sistema financeiro; art. 8º, parágrafo único, da Lei n. 8.072/90 — crimes hediondos; art. 16, parágrafo único, da Lei n. 8.137/90 — crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo; art. 1º, § 5º, da Lei n. 9.613/98 — lavagem de bens, direitos e valores; arts. 13 a 15 da Lei n. 9.807/99 — Lei de proteção a vítimas, testemunhas e réus colaboradores, aplicável a infrações de qualquer natureza; e art. 41 da Lei n. 11.343/2006 – entorpecentes.
É importante destacar alguns dos benefícios previstos nas legislações especiais, algumas compactuam dos mesmos, como a redução da pena, perdão judicial, progressão de regime. As demais têm sua especificidade, o não oferecimento da denúncia e a progressão de regime são algumas delas.
REFERÊNCIAS
RIOS, R.A.C.A.G.V. E. Esquematizado – Direito processual penal. Editora Saraiva, 2020. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788553619023/.
NUCCI, Guilherme de Souza. Curso de Direito Processual Penal. Grupo GEN, 2020. Disponível em: https://integrada.minhabiblioteca.com.br/#/books/9788530989989/.
Lei de Organizações Criminosas – 12.850/2013 (atualizada pela Lei 13.964/2019 – Anticrime). Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2013/lei/l12850.htm.
Bruna Oliveira – Acadêmica de Direito pelo Centro Universitário CESMAC, Maceió-AL. Cofundadora e ex-diretora da Liga Acadêmica de Empreendedorismo Jurídico – LAJE Jurídica. Afinidade pelo campo jurídico-criminal. Conhecimento e habilidades com o direito digital.