Segurança Pública
PF diz que espião russo está preso no Brasil
Agente de Moscou se passava por brasileiro e foi deportado da Holanda. Segundo inteligência holandesa, ele tentava se infiltrar no Tribunal Penal Internacional, que investiga acusações de crimes de guerra na Ucrânia
O serviço de inteligência da Holanda disse nesta quinta-feira (16/06) ter desmascarado um agente da inteligência militar russa que se passava por brasileiro para se infiltrar no Tribunal Penal Internacional(TPI), que está investigando acusações de crimes de guerra na Ucrânia.
Identificado como Sergey Vladimirovich Cherkasov, de 36 anos, o russo voou para a Holanda usando uma identidade falsa construída cuidadosamente durante 12 anos. Mas as autoridades holandesas negaram sua entrada no país e o colocaram no voo seguinte de retorno ao Brasil. O episódio ocorreu em abril, mas só agora foi revelado.
Ele se apresentava como cidadão brasileiro de 33 anos chamado Viktor Muller Ferreira. Segundo as agências de notícias Reuters e AFP, a Polícia Federal informou que o russo está preso no Brasil e será processado por uso de documentos falsos após ser deportado da Holanda.
“Operação de longo prazo”
Cherkasov tentou se infiltrar no TPI através de uma vaga que obteve para estágio no tribunal.
“Esta foi uma operação do GRU [serviço de inteligência militar da Rússia] de longo prazo e de vários anos, que custou muito tempo, energia e dinheiro”, disse Erik Akerboom, chefe do Serviço Geral de Inteligência e Segurança Holandês (AIVD).
A agência holandesa disse que deu o passo incomum de divulgar informações detalhadas sobre o caso para expor o funcionamento da inteligência russa e a ameaça que representa para outras instituições internacionais.
“Se o oficial da inteligência tivesse obtido acesso ao TPI, ele poderia reunir informações e recrutar fontes; teria sido capaz de influenciar processos criminais”, afirma o comunicado. “Por se apresentarem como estrangeiros, eles [espiões] têm acesso a informações que seriam inacessíveis a um cidadão russo.”
“Melhor feijoada de Brasília”
O órgão publicou em sua página na internet um documento de quatro páginas apresentando a biografia fictícia do suposto espião como cidadão brasileiro. O AIVD afirma que o documento foi provavelmente escrito em meados dos anos 2010 pelo próprio Cherkasov, para ajudá-lo a memorizar os detalhes de sua vida fictícia.
No texto, ele diz ter nascido em 4 de abril de 1989, em Niterói, no estado do Rio de Janeiro, e descreve sua vida pessoal conturbada por dificuldades financeiras e abandono paterno.
O documento, com muitos erros de português, também traz detalhes sobre um clube onde ele gostava de ouvir música eletrônica e fala sobre seu restaurante favorito em Brasília, que tem “a melhor feijoada da cidade”.
“Cherkasov usava uma identidade de fachada bem construída, pela qual ele escondia todos os seus laços com a Rússia em geral, e com o GRU em especial”, diz o comunicado do AIVD.
A polícia brasileira informou à Reuters que Cherkasov entrou no Brasil em 2010 e assumiu a identidade falsa de um brasileiro cujos pais morreram. Passando-se por brasileiro, morou na Irlanda e nos Estados Unidos por vários anos, segundo o comunicado da PF, acrescentando que ele havia retornado ao Brasil para preparar sua mudança para a Holanda.
Expulsões
O TPI, também conhecido como o Tribunal de Haia, é um tribunal global permanente de crimes de guerra com 123 Estados-membros. A Corte abriu uma investigação sobre crimes de guerra na Ucrânia poucos dias depois que o presidente russo, Vladimir Putin, enviou suas tropas para invadir o país em 24 de fevereiro.
Os holandeses expulsaram mais de 20 russos acusados de espionagem nos últimos anos. Eles incluem quatro pessoas acusadas em 2018 de hackear a Organização para a Proibição de Armas Químicas (Opaq), dois acusados de espionagem no setor corporativo de alta tecnologia em 2020, e 17 agentes suspeitos credenciados como diplomatas que foram expulsos após a invasão da Ucrânia neste ano.
A Rússia nega todas as acusações e reagiu às últimas medidas com a expulsão de 15 diplomatas holandeses e funcionários do consulado do país em Moscou e São Petersburgo.