Internacional
O futuro sombrio dos EUA
A tão temida retração da economia americana tem deixado o campo da especulação para se tornar realidade. Na quarta-feira (22), o próprio presidente do Federal Reserve (Fed), o Banco Central dos EUA, Jerome Powell, alertou para o aumento dos riscos de uma recessão no país em consequência da elevação da taxa de juros – hoje entre 1,5% e 1,75%, a maior desde 1994 – e da maior inflação em quatro décadas. “Estamos fortemente comprometidos em reduzir a inflação”, afirmou em audiência no Congresso. Questionado se isso poderia levar a uma recessão, ele foi sucinto: “É certamente uma possibilidade”.
Não há notícia que possa ser pior para os demais países. Com PIB de US$ 23 trilhões (2021), os EUA respondem por cerca de 25% da economia do planeta. A encruzilhada tem de um lado a alta dos juros – remédio mais que amargo em um país movido pelo consumo e desacostumado a reajustes bruscos de preços. Ela é defendida por Powell como a alternativa mais rápida do Fed para domar a disparada do índice. Em maio, a economia americana registrou inflação de 8,6% no acumulado de 12 meses. A meta é de 2%.© Fornecido por IstoÉ DinheiroO futuro sombrio dos EUA
“Estamos fortemente comprometidos em reduzir a inflação” Jerome Powell Presidente do Fed
Na Casa Branca, o presidente Joe Biden reconheceu que ela está “inaceitavelmente alta”. Em entrevista à Associated Press na quinta-feira (16) ele se comportou como presidentes do mundo todo: jogou a responsabilidade para longe. “Se a culpa é minha, por que em todos os outros grandes países industrializados a inflação ainda é mais alta?”. A pergunta é retórica e não tem efeito interno. Pesquisa Reuters diz que apenas 39% dos americanos aprovam seu governo, segundo pior índice desde que assumiu, em janeiro de 2021.
Se um lado da encruzilhada é controlar a inflação por meio de juros mais altos, o outro lado é que altas sucessivas podem desacelerar a economia num nível mais grave, o da recessão. O Bank of America (BofA) calcula que há 40% de risco de os Estados Unidos entrarem em recessão no ano que vem, em meio à combinação de um crescimento econômico fraco e uma inflação persistentemente elevada no país. Em relatório, o banco afirmou que o Federal Reserve ficou “atrás da curva”, demorando para agir no combate à escalada inflacionária, e enfrenta um horizonte desafiador. Nesse cenário, o BofA prevê que os juros chegarão ao pico acima de 4%, antes de a inflação se estabilizar em cerca de 3%, ainda superior à meta de 2% do Fed. O banco também reduziu a previsão para crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) americano no segundo trimestre, de 2,5% para 1,5%, após contração de 1,5% no primeiro trimestre.
O economista Nouriel Roubini, professor da Stern School of Business da Universidade de Nova York, publicou artigo no Project Syndicate no fim de abril em que demonstra pessimismo com os rumos da economia americana. Ele afirma que a estagflação está ocorrendo no país e que a recessão é inevitável. “A inflação está aumentando nos Estados Unidos e em muitas economias avançadas, e o crescimento está desacelerando drasticamente, apesar do enorme estímulo monetário, de crédito e fiscal”, afirmou o professor, conhecido como Dr. Doom (Doutor Catástrofe), por suas análises negativas. Apesar do pessimismo, ele tem propriedade para falar de crises. Em 2005, Roubini alertou que o preço dos imóveis residenciais surfava em uma onda especulativa no país. Em 2008, a bolha imobiliária explodiu nos Estados Unidos. Ele acertou.
CAUTELA Na contramão dos prognósticos apocalípticos para a economia americana, alguns analistas garantem que é preciso cautela na hora de prever a retração da maior economia do mundo. “A posição do BofA talvez seja um pouco precipitada em função dos dados recentes”, disse Lívio Ribeiro, pesquisador sênior da área de Economia Aplicada do FGV IBRE. O analista de investimentos globais da Spiti, Rodrigo Lima, também diz ser muito cedo para afirmar como inevitável um cenário de recessão no país. Os riscos de uma recessão, segundo ele, estão amparados no alerta de analistas que têm observado o comportamento das curvas de juros nos EUA, cuja inclinação vem aumentando recentemente, retirando liquidez da economia global.