Internacional
Plano de emergência da UE compensará a falta do gás russo?
Comissão Europeia espera amainar a crise do combustível fóssil, gerada por corte de abastecimento russo, com diretrizes baseadas em apoio mútuo entre Estados-membros. Questionável é se o apelo à solidariedade funcionará
Que regras vigorarão na União Europeia se houver escassez de gás?
Se após o fim dos trabalhos de manutenção do gasoduto Nord Stream 1, a Rússia não restabelecer o fornecimento, entra em vigor uma diretriz da UE para garantia do abastecimento de gás, de 2017, devidamente abreviada Regulamento SOS (Security Of Supply).
Para enfrentar mais essa consequência indireta da guerra na Ucrânia, os Estados-membros deveriam ter desenvolvido planos de emergência e um sistema de alarme em três estágios. No entanto nem todos os governos fizeram seu dever de casa.
Os membros da UE são divididos em grupos regionais, que partilham riscos comuns. Um deles é o dos Países Bálticos (Estônia, Letônia, Lituânia) e a Finlândia, que até agora dependiam inteiramente do gás russo e em parte já procuram alternativas. Outro grupo reúne Portugal, Espanha e França, que só importam pouco gás da Rússia e não seriam atingidos diretamente por uma suspensão do fornecimento.
Segundo o Regulamento SOS, em caso de crise os países-membros teriam a obrigação de se ajudar de modo “solidário”, ou seja, fornecer-se gás reciprocamente e trocar informações. Além disso, seus reservatórios devem estar pelo menos 80% cheios, antes do período em que o uso da calefação se faz necessário. Segundo especialistas, contudo, ambos os compromissos ficam extremamente difíceis de cumprir na falta total do maior fornecedor, a Rússia.
Que papel ocupa a Alemanha no mercado de gás da UE?
A Alemanha é a maior importadora da Europa do combustível fóssil russo, e importante país de trânsito para o gás transportado pelo Nord Stream e outros gasodutos.
Uma questão a esclarecer é se, em caso de corte total desse fluxo, o país teria que passar adiante para outros Estados-membros o gás que recebe da Noruega ou da Holanda, por exemplo, mesmo estando, ela própria, atingida pela carestia.
No momento o ministro da Economia Robert Habeck negocia com países vizinhos sobre o fornecimento em caso de emergência: “Temos que estudar as eventualidades e determinar o que acontecerá e quando, exatamente. Ou seja: quando se decreta a escassez de gás, em que países, em que estágios”, comentou durante encontro com seu homólogo tcheco, Josef Sikela.
Habeck fechou um acordo com Praga segundo o qual a escassez será administrada em conjunto, para que nenhum país europeu seja excessivamente prejudicado. A República Tcheca, por exemplo, recebe seu gás quase exclusivamente pelos gasodutos alemães, assim como a Polônia. A Suíça depende inteiramente do fornecimento através da Alemanha.
A “solidariedade” vai funcionar no abastecimento de gás na UE?
O Regulamento SOS da UE prevê que o gás só tem que ser fornecido aos Estados que tenham decretado estado de emergência e tomado todas as medidas para reduzir o consumo.
A compra e venda segue sendo regulada por fornecedores em parte privados, em parte estatais, o que constitui um processo complexo em tempos de crise. Até o momento a UE descarta um teto máximo para os preços, como sugerido pela Itália, considerando a medida contraproducente.
A Hungria declarou estado de emergência, proibindo todas as exportações de energia e, portanto, se excluindo de vez da comunidade solidária. Georg Zachmann, especialista em energia do think tank Bruegel, de Bruxelas, critica a medida: “Para um país sem portos, com um consumo de 10 bilhões de metros cúbicos e reservas de apenas 3 bilhões de metros cúbicos, não estou seguro de que seja uma decisão muito inteligente.”
A Comissão Europeia vem instando os países-membros a fecharem acordos recíprocos de fornecimento soildário, já que Bruxelas não oferece uma organização centralizada, por quotas ou outros meios. Até agora a Alemanha fechou três acordos: com a Dinamarca, Áustria e República Tcheca. Há outros, envolvendo os Países Bálticos e a Finlândia, assim como entre a Itália e a Eslovênia.
As relações de propriedade entre os fornecedores são igualmente complexas, já que as participações dentro do mercado interno da UE são muitas vezes transnacionais. Por exemplo: o Estado finlandês é proprietário de parte da maior operadora de gás da Alemanha. Assim, não é simples determinar quem salva quem, se empresas privadas entrarem em apuros.
O que os Estados da UE estão fazendo para evitar a crise do gás?
A busca por alternativas transcorre sob pressão máxima. Os Países Bálticos e a Alemanha apostam em mais gás liquefeito do Oriente Médio ou dos Estados Unidos – que em parte só poderá ser entregue através de terminais flutuantes, a serem ainda construídos.
A Itália compra gás natural da Argélia e do Azerbaijão, e da Noruega, Reino Unido, Argélia e Holanda estão vendendo contingentes adicionais a preços cada vez mais altos.
No entanto, a Comissão Europeia, estima que nada disso bastará para compensar as lacunas do fornecimento russo, e urge a que se economize e reduza o consumo por determinadas instalações públicas.
O que prevê o plano de emergência energética da União Europeia?
Na penúltima semana de julho, a Comissão Europeia apresentará um plano de emergência para o fornecimento de energia. Segundo este, a eletricidade das usinas de gás será prioritariamente destinada ao aquecimento e uso na cozinha para os consumidores privados. Em princípio a indústria ficará em segundo plano.
Além disso, nas estações frias o aquecimento de repartições públicas e locais de trabalho ficará limitado a 19ºC. Parte-se do princípio que a poupança nas residências e empresas permitirá compensar cerca de um terço da lacuna de abastecimento resultante da falta do gás russo.
Quanto as demais dois terços, dentro de 12 dias os ministros de Energia da UE deliberarão que medidas adotar, numa reunião extraordinária. Está decidida a criação de uma plataforma para compra conjunta de gás, mas ela ainda não está em funcionamento.
A Alemanha discorda em parte da estratégia da UE. Antes, o país também anunciara que, na distribuição de energia, as residências privadas teriam prioridade perante a indústria. Porém recentemente o Ministério da Economia sugeriu que a regra não se aplicará necessariamente em caso de escassez extrema. O argumento é que a diretriz da UE se refere a uma breve interrupção de abastecimento em países isolados, mas não a uma escassez abrangente como a atual.