Judiciário
STJ dá seis meses para Anvisa definir regras para importação de cannabis
A relatora frisou que a decisão se limita às variedades da planta com baixo teor de tetrahidrocanabinol (THC)
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) liberou, nesta quarta-feira (13/11), a importação e o cultivo de cannabis para fins medicinais, farmacêuticos e industriais no Brasil. A decisão unânime ocorreu na 1ª Seção, sob relatoria da ministra Regina Helena Costa, no Recurso Especial (REsp) 2024250/PR. Transformado em incidente de assunção de competência (IAC), o julgamento firma jurisprudência para casos semelhantes que tramitam em instâncias inferiores.
A relatora frisou que a decisão se limita às variedades da planta com baixo teor de tetrahidrocanabinol (THC), substância responsável pelos efeitos psicoativos. Em seu voto, a ministra argumentou que há uma omissão regulatória da questão por parte dos poderes Executivo e Legislativo. O voto apresentou também a incongruência entre a possibilidade de importação de medicamentos à base de canabidiol (CBD) enquanto ficava proibida a fabricação nacional da substância para finalidades medicinais.
A ministra também destacou os prejuízos causados aos pacientes, que pagam mais caro pelos medicamentos importados, ao Sistema Único de Saúde (SUS) e às empresas nacionais motivados pela proibição. A relatora argumentou ainda que a ação não trata do uso recreativo da planta, limitando-se aos usos industrial, farmacêutico e medicinal.
Por fim, a ministra deu parcial provimento ao recurso para permitir que a empresa DNA Soluções em Biotecnologia Eireli importe sementes de cannabis, desde que a variedade da planta tenha teor inferior a 0,3% de THC, para uso exclusivo em atividades farmacêuticas, medicinais e industriais. A decisão também pondera que o cultivo deve seguir normas e fiscalização impostas pela União – especialmente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério da Saúde e do Ministério da Agricultura e Pecuária (Mapa). Pelo voto do colegiado, a União tem prazo de seis meses para regulamentar o assunto.
Teses
Os ministros da 1ª Seção fixaram as seguintes teses no julgamento que autorizou o plantio e a importação de cannabis para fins medicinais, industriais ou farmacêuticos:
- Nos termos da lei de drogas, não pode ser considerado proscrito o cânhamo industrial, variedade da cannabis com teor de THC inferior a 0,3%, porquanto inapto à produção de drogas;
- De acordo com a convenção única sobre entorpecentes e a lei de drogas, compete ao Estado brasileiro estabelecer a política pública atinente ao manejo de todas as variedades da canabis, inclusive o cânhamo industrial, não havendo, atualmente, previsão legal e regulamentar que autorize seu emprego para fins industriais distintos dos medicinais e/ou farmacêuticos, circunstância que veda a atuação do Poder Judiciário quanto a esses outros aspectos;
- À vista da disciplina normativa para os usos médicos e/ou farmacêuticos da cannabis, as normas expedidas pela Anvisa, Ministério da Saúde e outros, proibindo a importação de sementes e o manejo doméstico da planta devem ser interpretadas de acordo com as disposições legislativas, não alcançando, em consequência, a variedade descrita no item 1 das teses, o cânhamo industrial, cujo teor de THC é inferior a 0,3%;
- É lícita a concessão de autorização sanitária para plantio, cultivo e industrialização e comercialização do cânhamo industrial por pessoas jurídicas para fins exclusivamente medicinais e/ou farmacêuticos, atrelados à proteção do direito à saúde, observada a regulamentação a ser editada pela Anvisa e atendidos os requisitos fixados pela União, pelos seus diversos ministérios.
- Em sua atuação normativa incumbe à Anvisa e à União, no exercício da discricionaridade administrativa, avaliar a adoção de diretrizes destinadas a obstáculos ao desvio ou à destinação indevida das sementes e das plantas.
Novos avanços precisam ser conquistados
Para o advogado Rodrigo Mesquita, vice-presidente da Comissão Especial de Direito da Cannabis Medicinal da OAB Nacional, a decisão desta quarta representa um avanço político importante. “O voto da ministra Regina Helena conseguiu angariar a unanimidade, então é uma decisão muito eloquente politicamente”, explica.
Apesar disso, segundo ele, a posição poderia ter sido ainda mais avançada. “A Lei de Drogas não faz essa distinção entre THC e CBD. Tanto CBD quanto THC são substâncias já regulamentadas pela Anvisa com o reconhecimento da utilidade medicinal de ambas”, acrescenta.
Com a longa duração deste julgamento nesta quarta-feira (13/11), outros processos pautados para a sessão foram adiados, como o Tema 1080, em que ministros vão decidir se pensionistas de militares têm direito à assistência médico-hospitalar.