Internacional
Lavrov critica parceria do Brasil com Alemanha e Japão no G4
No Itamaraty, ministro russo disse que posições do Brasil têm sido “equilibradas e responsáveis”, mas que país “não faz a coisa certa” ao se unir com Alemanha e Japão para a ampliação do Conselho de Segurança da ONU
O ministro das Relações Exteriores da Rússia, Serguei Lavrov, criticou nesta segunda-feira (17/04) a posição de Brasil e Índia por buscarem em conjunto um assento permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas ao lado de Alemanha e Japão.
Durante uma aula magna a portas fechadas para jovens diplomatas no Instituto Rio Branco, a academia diplomática do Itamaraty, o homem forte da diplomacia de Vladimir Putin sugeriu que os governos brasileiro e indiano “não fazem a coisa certa” ao buscarem a reforma do Conselho de Segurança em parceria com japoneses e alemães. Lavrov fez referência ao G4, grupo de países formado em 2005 com o objetivo de apoiar as respectivas candidaturas a cadeiras permanentes no conselho.
“Os países ocidentais reivindicam a Alemanha e o Japão, que também são parte integrante do mundo ocidental. Eles não vão agregar valor ao Conselho de Segurança”, alegou o ministro russo, de acordo com uma gravação da palestra obtida pela DW.
“E explicamos aos nossos amigos brasileiros e indianos que quando eles continuam se movendo como um grupo de quatro, Brasil, Índia, Alemanha e Japão, eles não estão fazendo a coisa certa para seus próprios interesses. Nós não podemos aumentar a injustiça que já existe na atual composição do Conselho de Segurança. Acrescentar mais dois países que fazem sempre o que é esperado pelos americanos não vai torná-lo mais equilibrado ou mais representativo”, explicou.
O ministro reiterou que a Rússia apoia os pleitos dos países em desenvolvimento. “Vemos o Brasil como um candidato lógico e forte para obter cadeira permanente no Conselho de Segurança. Apoiaremos o pedido do Brasil, bem como o pedido da Índia e a necessidade simultânea de satisfazer os interesses dos nossos amigos africanos”, afirmou.
Brics e posições do Brasil
Na palestra, Lavrov afirmou que o Brics é uma das prioridades da política externa russa, caracterizando o bloco como “modelo exemplar da diplomacia global do século 21”. Ele afirmou que o bloco formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul é um dos pilares do “sistema multipolar” que seu país tenta formar na reforma de instituições internacionais.
Além de estudantes do Instituto Rio Branco, a palestra foi acompanhada por integrantes do alto escalão do Ministério das Relações Exteriores, incluindo Maria Laura Rocha, secretária-geral do Itamaraty. Lavrov palestrou logo depois de se reunir com o ministro Mauro Vieira, das Relações Exteriores, e pouco antes de se reunir com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio da Alvorada.
Durante a aula magna, o russo também elogiou as posições adotadas pelo Brasil durante o conflito na Ucrânia, caracterizando-as como “equilibradas e responsáveis”. Na gravação, Lavrov enumera algumas posturas cruciais adotadas pela diplomacia brasileira nas últimas semanas que foram vistas com bons olhos por Moscou.
“Agradecemos muito o voto brasileiro do Conselho de Segurança da ONU em apoio ao nosso pedido de abertura de uma investigação independente sobre os ataques terroristas aos gasodutos Nord Stream”, disse Lavrov durante a palestra, ministrada em inglês.
“A decisão de dissociar-se da chamada Cúpula pela Democracia é mais um importante posicionamento que confirma a condição do Brasil de verdadeiro campeão da genuína multipolaridade”, acrescentou. No final de março, o governo brasileiro rejeitou o convite da Casa Branca para assinar a declaração final da Cúpula para a Democracia de 2023. O documento exige uma retirada incondicional dos militares russos do território da Ucrânia.
Críticas ao Ocidente
Ainda na palestra aos jovens diplomatas brasileiros, Lavrov passou a criticar o que chamou de “regime russofóbico racista em Kiev, levado ao poder pelo golpe ilegal em 2014”. Ele comparou a posição do Brasil com a de outros países, dizendo que “a maioria dos países do mundo se recusa a aderir à campanha de sanções e propaganda política” do Ocidente contra a Rússia. Ele também comparou as narrativas ocidentais à propaganda nazista. “As pessoas responsáveis entendem que a situação na Ucrânia nada mais é do que o resultado da crise de segurança europeia provocada pela Otan”, acrescentou.
O presidente Lula sugeriu recentemente a formação de um grupo de nações ditas neutras para intermediar negociações de paz entre a Rússia e a Ucrânia. Mas ele também acusou os EUA de encorajar o conflito por meio do envio de armas à Ucrânia e, durante uma coletiva de imprensa no sábado, o líder brasileiro sugeriu que tanto a Ucrânia quanto a Rússia são responsáveis pela guerra. O Brasil também negou repetidos pedidos de venda de armas feitos pela Ucrânia e países do ocidente.
Na semana passada, durante uma reunião com o presidente Xi Jinping da China, Lula endossou a estrutura de 12 pontos de Pequim para a paz, um documento criticado por diplomatas ocidentais por não prever uma retirada das forças russas do território ucraniano.
John Kirby, porta-voz do Conselho de Segurança Nacional da Casa Branca, acusou o líder brasileiro de “papagaiar a propaganda russa e chinesa sem olhar para os fatos”. Durante uma coletiva de imprensa na noite de segunda-feira, o ministro Mauro Vieira, disse que discordava dessa conclusão. A União Europeia também rejeitou uma fala de Lula em que o presidente brasileiro acusou o bloco de prolongar o conflito. Já a Ucrânia voltou a covidar Lula a viajar a Kiev e “entender as causas reais da guerra”.
A posição do Brasil é delicada. O país pediu paz e criticou a invasão da Rússia em declarações na ONU. Também votou a favor de uma resolução da que condena a agressão da Rússia e pede uma paz duradoura.
Mas o país, que depende da Rússia para a importação de fertilizantes, tentou equilibrar essas posições com tentativas suavizar as resoluções, com o objetivo de soar neutro. Em declarações recentes perante o Conselho de Segurança da ONU, diplomatas brasileiros criticaram as sanções ocidentais e o fluxo de armas para a Ucrânia. Eles também disseram que uma solução para a crise deve considerar “as preocupações de segurança de ambos os lados”.
Na segunda-feira, falando em declaração à imprensa ao lado de Lavrov, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Mauro Vieira, pediu um cessar-fogo imediato sem mencionar a retirada das tropas russas das terras ocupadas. O ministro russo, por sua vez, disse que Brasil e Rússia têm abordagens consonantes para as questões internacionais atuais; ele também agradeceu aos esforços do Brasil para buscar a paz.