ECONOMIA
Relação entre tecnologia e finanças segue ampliando lucros dos bancos no Brasil
‘Dados permitem compreender a digitalização do setor bancário, com efeito sobre emprego e na relação com os clientes’, escreve o colunista Roberto Moraes.
O quadro (tabela) abaixo permite fazer uma série de leituras e análises. Vamos brevemente apenas alguns pontos. A motivação para a produção da tabela abaixo com dados atuais decorreu de várias matérias na mídia corporativa e financeira informando o fato do banco digital Nubank ter ultrapassado o Banco do Brasil (BB), em número de clientes no Brasil, mesmo sem ter uma única agência física.
Sem nenhuma agência e com menos de 10% do total de funcionários do Banco do Brasil, o Nubank já tem valor de mercado que é quase 30% maior que esse, o primeiro banco surgido no Brasil.
A CEF foi colocada no final dessa lista feita por ranking de valor de mercado, mas se trata de um banco estatal que não opera na Bolsa, não tendo um valor de mercado, embora seja um dos principais bancos que operam no varejo no Brasil.
A Caixa Econômica Federal (CEF) lidera no país o número de clientes que chega a 150,4 milhões; o Itaú vem em segundo com cerca de 100 (99,9) milhões de clientes. A CEF tem 86 mil funcionários, mesmo n.º do BB. A CEF é em boa parte o banco dos pobres do Brasil, atendendo aos diversos programas de proteção social e políticas de habitação e saneamento.
No extremo contrário da CEF está o BTG, um banco que é mais um banco de investimentos, mas que há algum tempo passou a também a atender no varejo como banco digital (via aplicativo) e muito voltado para aplicações no mercado financeiro e de capitais. Já o Itaú, é atualmente, no Brasil, o banco com o maior valor de mercado, chegando a US$ 58,7 bilhões.
Um valor bem expressivo, mesmo no mundo, sendo que no Brasil perde apenas para a gigante Petrobrás que tem US$ 94,6 bilhões de valor de mercado e está na 169º lugar no ranking mundial, sendo a 9ª entre as petroleiras com ações em bolsa.
Vale dizer que além da presença majoritária do setor financeiro entre as corporações com maior valor de mercado no Brasil, esse é o setor que, ano após ano, vem batendo recordes em lucro líquido. Em 2022 no Brasil, o lucro líquido médio dos bancos somou R$ 138 bilhões (a maioria dos quatro maiores bancos: BB, Itaú, Santander e Bradesco), mais que o dobro do lucro de R$ 59 bilhões registrados há uma década em 2021.
Somando os seis bancos do quadro acima mais a CEF eles chegam ao número de 424,8 mil funcionários. Só a CEF junto com o BB chega a 172 mil funcionários, cerca de 40% do total dessa lista. O número de clientes destes seis bancos junto com a CEF chega a 580 milhões, o que permite interpretar que entre a população bancarizada no Brasil, a maioria tem pelo menos três a quatro contas em bancos diferentes.
Esses dados e indicadores permitem ainda compreender outros processos, entre eles a digitalização (plataformização) do setor bancário, com efeito sobre o emprego e também em termos de relação com os clientes. Esses dados mostram o avanço do esquema da relação entre finanças e tecnologia, de onde sai a expressão “fintech”, usada para se referir a esses bancos digitais sem agências e com relação via aplicativos e telefone.
As diferenças na relação entre n.º de clientes e n.º de funcionários que nos extremos variam de 10.000 no Nubank, a 235 no BTG (poucos e ricos correntistas), ou de um valor entre 867 no BB, 999 no Itaú e cerca de 1.200 no Bradesco e Santander parecem indicar uma tendência de ampliação da bancarização em n.º de clientes com menor número de bancários fruto da expressiva digitalização.
A relação recorde n.º de clientes por n.º de funcionários é identificada na CEF chegando a 1.748, o que evidencia não apenas a capilaridade de um banco popular e com presença forte em todo o país, mas a ótima relação entre nº de clientes por funcionário, o que também demonstra produtividade, como já foi dito, em especial nos programas de proteção social.
O valor de mercado do Nubank, 30% acima do tradicional Banco do Brasil e praticamente empatado com o Bradesco, confirma outra evidência, no processo que vem alterando a forma como as pessoas se relacionam com o setor financeiro (bancos). A abertura de contas, depósito e transferências (com e sem Pix), aplicações e investimentos, resgates, contratação de seguros, etc. foi e continua sendo completamente transformado.
Trata-se em boa parte do mesmo processo que vem atingindo outros setores da economia: a plataformização. O fato também reforça a compreensão sobre a hegemonia financeira no capitalismo contemporâneo. Como tenho insistido, tanto o setor de tecnologia como o de finanças têm atuação transversal com ação sobre todos os demais setores de atividade humana na sociedade. Assim, juntos e misturados, tecnologia e finanças avançam, ampliando o controle, participação acionária e a captura de valor sobre os demais setores da economia.
Outra transformação em curso é sobre a forma de intermediação financeira na atualidade. Os bancos tradicionais atuavam de forma exclusiva nesse setor, captando investidores e ofertando créditos. Hoje, isso continua a ser feita tanto pelos bancos tradicionais da forma já conhecida, como pelas suas plataformas e aplicativos digitais como fazem as fintechs.
A intermediação financeira deixa de ser apenas via créditos (empréstimos), mas os negócios, em especial os grandes projetos de investimentos (GPIs) e aqueles que são intensivos em capital como os de infraestruturas são cada vez mais viabilizados e controlados por gestoras de fundos financeiros que passam a gerir a aplicação em capital fixo no território para implantação de negócios na economia real, como na aplicação e inovação em papéis, títulos e certificados e lançamento de ações no mercado de capitais.
Há várias outras análises possíveis de serem feitas para se analisar o movimento do setor bancário e financeiro no Brasil. Há bons pesquisadores que acompanham em detalhes esse setor, comparando ao movimento global e também a relação deste setor com o mercado de capitais e a hegemonia financeira no capitalismo contemporâneo.