Segurança Pública
PCC usa mergulhadores no Porto de Santos para o tráfico de drogas
Apreensões nos cascos de navios aumentam três vezes em três anos. Ação militar frente ao narcotráfico é implementada, mas especialistas avaliam operação de criminosos dentro da estruruta portuária
Em uma operação meticulosa, aproximadamente 50 militares embarcam em um navio cargueiro no Porto de Santos. Durante seis horas de intensa inspeção, as equipes vasculham a embarcação, utilizando recursos que vão desde cães farejadores até mergulhadores em busca de drogas.
Nos últimos tempos, o Primeiro Comando da Capital (PCC) vem empregado uma tática cada vez mais recorrente: esconder grandes volumes de cocaína na parte submersa dos navios, uma estratégia desafiadora para as autoridades. Os portos brasileiros representam a principal rota de saída do entorpecente com destino à África e Europa.
Em resposta a esse desafio, o governo emitiu em novembro, um decreto de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), autorizando a ação militar em portos e aeroportos de São Paulo e Rio de Janeiro até maio, com o objetivo de conter o avanço do narcotráfico.
Segundo Anderson Pomini, presidente da Autoridade Portuária de Santos, “a principal estratégia utilizada pelos traficantes atualmente é fixar a droga no casco do navio”. Embora não seja a modalidade com o maior número de apreensões, o uso de “caixas de mar” (recipientes localizados no casco) está ganhando força em comparação às estratégias tradicionais, como a ocultação de pacotes entre grãos nos contêineres.
No entanto, o transporte por contêiner apresenta maior risco no envio de cargas para a Europa e África, pois são sujeitos a scanners imediatamente após a chegada aos terminais. Por outro lado, o casco de navio é mais difícil de fiscalizar, embora permita o envio de uma quantidade menor de drogas por vez.
Uma ação conjunta da Polícia Federal, Receita Federal e Marinha no início de 2023 resultou na apreensão de aproximadamente 290 kg de cocaína, encontrados no casco de um navio carregado de celulose. Os traficantes utilizaram até mesmo anilhas de academia para fixar os pacotes no recipiente. O navio, que tinha como destino o Porto de Martas, na Turquia, foi inspecionado enquanto estava ancorado na área de fundeio do Porto de Santos.
As investigações indicam que os pacotes são geralmente levados aos navios de duas maneiras: por meio de pequenas lanchas, que geralmente se movimentam à noite com as luzes apagadas, ou por mergulhadores, que partem de áreas de mata ou de embarcações mais distantes.
Nos últimos anos, as apreensões de drogas no casco dos navios triplicaram, atingindo 1,68 tonelada em 2023, de acordo com dados da Marinha. Essa quantidade é mais que o triplo do registrado em 2020, quando foram apreendidos 483 quilos.
Os números revelam uma tendência alarmante. Em 2020, apenas 2,3% do total de drogas foram encontradas no casco dos navios. Em contraste, em 2023, esse percentual saltou para 13,5%, conforme dados obtidos pela Alfândega de Santos pelo Núcleo de Estudos da Violência da USP.
“São 24,6 km de canal, 60 berços de atracação e mais 60 navios esperando lá na área de fundeio (atracadouro). Como fiscalizar isso?”, questiona Pomini. “Precisaríamos de pelo menos 250 mergulhadores, com lanchas próprias, equipamentos e infraestrutura adequada.”
A Guarda Portuária não dispõe de mergulhadores, mas atualmente há quatro profissionais da Marinha atuando no Porto de Santos. Adicionalmente, cerca de 400 militares estão presentes em Santos em virtude da GLO. As equipes em operação são rotacionadas continuamente pela Marinha.
“Entendemos que os números de efetivo são insuficientes dadas as dimensões do Porto de Santos, mas buscamos utilizar informações de inteligência para agir pontualmente e com precisão”, afirma o capitão dos Portos de São Paulo, Marcus André de Souza e Silva.
A operação de GLO tem demonstrado resultados imediatos, com mais de 27 mil abordagens em veículos, 7,4 mil fiscalizações em embarcações e 17,5 mil inspeções em pessoas e bagagens nos primeiros quatro meses de implementação. No entanto, especialistas levantam dúvidas sobre a sustentabilidade dessas ações a longo prazo.
“A GLO não pode ser prorrogada indefinidamente”, observa Ricardo Moura, do Laboratório de Estudos da Violência da Universidade Federal do Ceará (UFC). “É necessário pensar em como será a continuidade desse combate ao crime, além de incorporar essa experiência às polícias estaduais.”
Diante desse cenário, a cooperação entre as autoridades, a implementação de tecnologias avançadas de vigilância e o fortalecimento das instituições de segurança são fundamentais para enfrentar o desafio do tráfico de drogas nos portos brasileiros.