CONCURSO E EMPREGO
Os cuidados que o Brasil deve ter na redução da jornada de trabalho
Não se mexe na carga horária dos trabalhadores com uma caneta a serviço da política
É atraente, do ponto de vista político, a proposta de alteração da Constituição Federal que possibilite ao trabalhador ampliar o seu tempo com lazer, reduzindo os atuais 6 x 1 para uma escala menor de trabalho e, hipoteticamente, potencializar o aumento de oferta de emprego com a necessidade preeminente de ocupar as vagas disponíveis para atender tal política. A pergunta que precisamos nos debruçar é: considerando o baixo grau de produtividade, as lacunas no desenvolvimento de competências profissionais, a infraestrutura tecnológica limitada, além da pressão fiscal constante nas nossas contas, o Brasil está pronto para dar este salto?
Não se discute os benefícios para o trabalhador e, consequentemente, para sociedade, que a redução da jornada pode trazer. Neste artigo, o que se propõe é a necessidade de um debate que enfrente questões da economia real, como a diversidade entre os setores impactados e as diversidades regionais, por exemplo.
De parte das empresas, a possível forma de compensar esta lacuna que representaria a diminuição da carga horária do trabalhador, seria a introdução de serviços tecnológicos para garantir a produtividade do trabalho com vistas a reduzir os impactos nos custos de produção, uma vez que introduzir tecnologia também acarreta custos.
Acontece que o Brasil está em 57º lugar no mundo no ranking de competitividade digital de 2023, divulgado pelo IMD World Competitiveness Center em parceria com o Núcleo de Inovação e Empreendedorismo da Fundação Dom Cabral (FDC). De forma clara, não temos a capacidade de responder de forma estrutural a chamada por esta necessidade de ganho de produtividade.
Por outro lado, as empresas poderiam dispor de mão de obra mais qualificada para suprir esta queda na produtividade, representada pela diminuição de horas laborais. Mas vejamos os nossos dados de qualificação de mão de obra no Brasil. Segundo o Relatório Global de Talento 2023 – INSEAD (Instituto Europeu de Administração de Negócios), o Brasil encontra-se na 69ª posição entre 134 países quando analisada a baixa qualidade educacional, defasagem tecnológica, limitação de formação técnica e desconexão da educação com o mercado como os principais fatores identificados.
Ainda que a redução de jornada não seja a constante na proposta apresentada pela deputada Erika Hilton, e que o 4 x 3 possa ser o ponto de saída para negociar um 5 x 2, não é possível garantir que o conjunto dos trabalhadores sairá beneficiado com tal medida. O mercado de trabalho e a economia seguirão os seus pragmatismos costumeiros. Sem condição de manter a produtividade com incremento tecnológico e com a baixa qualificação da mão de obra, o empregador aumentará o custo da sua folha, ainda que pressione pela diminuição dos salários pagos aos seus trabalhadores. A consequência imediata ao cumprimento da nova política será o aumento do custo de produção, precarização da força de trabalho e a pressão por salários mais achatados.
Para a economia, uma alteração desta ordem, sem planejamento, tem o potencial de reduzir o Produto Interno Bruto (PIB), diminuir a capacidade produtiva e elevar os custos para as empresas com o potencial aumento de preços na economia e a tão indesejada inflação.
Em última análise, não se mexe na carga horária dos trabalhadores com uma caneta a serviço da política. O esforço representado por esta proposta, necessariamente deverá ser precedido por um investimento massivo em qualificação profissional, modernização tecnológica, desburocratização e consolidação da Reforma Tributária. Porém, infelizmente, a política tem pressa.