Internacional
Áustria relaxa lockdown, mas aposta em testes em massa
Segundo premiê, austríacos estavam “cansados” do confinamento. Além da pressão da economia, para pais e professores o ensino à distância estava insustentável. Reabertura é compensada com maiores controles de fronteiras
Após seis semanas de confinamento, na manhã desta segunda-feira (08/02) a Áustria ordenou a reabertura de suas escolas e estabelecimentos comerciais. Nos bastidores, porém, há discussões acaloradas, sobretudo sobre como lidar com o estado do Tirol, fronteiriço com a Alemanha. Especialistas alertam contra a propagação descontrolada da variante do vírus Sars-Cov-2 descoberta na África do Sul.
Cogitou-se isolar a região, mas no fim o governo austríaco optou por uma advertência sobre as viagens em seu próprio território: estão desaconselhados deslocamentos não essenciais ao Tirol, e quem retorne de lá deve se submeter urgentemente a um teste de covid-19.
Ainda assim, as flexibilizações para escolas e lojas valem para todo o país. Isso, apesar de a incidência semanal superar os 100 contágios por 100 mil habitantes, bem acima do nível atualmente registrado na Alemanha, que provavelmente resultará numa prolongação do lockdown.
O povo estava “cansado”
Até agora, na pandemia de covid-19 a Áustria tem muitas vezes se orientado pelas medidas adotadas pela grande vizinha, Porém agora o país de 9 milhões de habitantes resolveu adotar um curso diferente.
Segundo o chanceler federal Sebastian Kurz, em entrevista ao semanário Welt am Sonntag, a população está cansada do confinamento. “Nas últimas duas semanas, nossos níveis de contágio não baixaram mais, pois cada vez menos cidadãos seguiram as diretrizes e querem novamente mais liberdade.”
Mas as novas liberdades terão seu preço para os austríacos: em diversos setores vigora regime estrito de testes e rastreamento de contatos. Para se ir ao cabeleireiro, se deverá apresentar um teste recente de covid-19, e passam também a valer exigências intensificadas para quem chegue de viagem.
A partir da quarta-feira, os que entram e saem diariamente do país para trabalhar ou estudar terão também que se registrar eletronicamente e fazer o exame de coronavírus.
Para os demais viajantes, as determinações são ainda mais duras: quem, do estado alemão da Baviera, resolva atravessar rapidamente a fronteira para abastecer o carro, terá que ficar em quarentena, mesmo apresentando exame negativo. Os controles de fronteiras mais estritos são parte do preço a ser pago para que a população austríaca tenha mais liberdade.
Pressão dos pais de alunos
O governo austríaco estava pressionado por vários lados; sobretudo a economia dependente do turismo havia soado o alarme. Mas também nas escolas o descontentamento vinha se acumulando, revela à DW Paul Kimberger, presidente do sindicato de professores das escolas obrigatórias da Áustria.
“A pressão por parte dos pais era altíssima”, diz, e, a seu ver, a alternativa às aulas presenciais não mais se sustentava. “A constatação das últimas semanas e meses é que o ensino à distância não substitui a aula presencial. Não se trata tanto da transmissão de conhecimento, mas da escola como estrutura social.”
O ministro da Educação Heinz Fassmann, do conservador Partido Popular Austríaco (ÖVP), concorda: “É muito importante as crianças e adolescentes reencontrarem seus amigos, e voltarem a ter uma estrutura de tempo vinculativa.”
Tanto sindicalistas quanto políticos admitem, contudo, que o momento escolhido para a abertura é delicado, diante da propagação acelerada das mutações do coronavírus. Para mesmo assim manter a situação sob controle, Viena aposta na expansão maciça dos testes e na divisão das classes escolares.
“Teste tirador de meleca” para crianças
Antes das aulas, a partir de agora todos os alunos terão que se submeter ao teste rápido de antígenos do Sars-Cov-2. Só apresentando resultado negativo poderão participar das aulas presenciais. Quem não queira, de dias em dias, enfrentar o “teste do tirador de meleca” como é conhecido na Áustria, terá que aprender de casa.
Ao contrário dos exames executados por pessoal médico profissional, em que a amostra é retirada da parte posterior da garganta, no nasenbohrer-test o próprio paciente introduz um cotonete apenas alguns centímetros nariz adentro. Isso torna o exame bem menos desconfortável para as crianças, mas também menos confiável.
Mesmo assim, as autoridades registraram 32 resultados positivos no primeiro dia de aulas, somente em Viena. “O investimento logístico para essa medida é enorme”, explica o líder sindicalista Kimberger. “Precisamos de 1,8 milhão de autotestes de antígenos para as alunas e alunos. Também os 126 mil professores e professoras da Áustria serão testados regularmente.”
Novo confinamento em breve?
As regras governamentais para as escolas se baseiam, entre outros, num estudo realizado por pesquisadores austríacos em janeiro. Entre seus autores esteve a física Jana Lasser, da Universidade Médica de Viena e da organização de pesquisa Complexity Science Hub Vienna.
Ela considera viável a atual reabertura das escolas sob precauções de segurança estritas: “No cálculo de modelo, vemos que, sob as medidas agora adotadas, caso o vírus chegue a uma escola, deverá haver de nenhum a, no máximo, três ou quatro casos resultantes.”
O perigo de propagação varia de acordo com o tipo de escola, devendo ser mais reduzido nas de ensino fundamental. Isso se deve a seu porte modesto, às classes menores, de no máximo 20 alunos, e ao fato de quase não utilizarem professores de matérias específicas, que trocam de classe várias vezes ao dia, explica Lasser.
Em breve se constatará se os testes em massa de fato aumentaram a segurança sanitária nas escolas. O sindicalista Kimberger conta ter escutado muitos prognósticos sombrios nos últimos tempos: “Alguns especialistas dizem que essa abertura das escolas já vai acabar dentro de três semanas, e que aí vamos ter que fechar de novo.”