Internacional
‘Mudanças em Cuba são imparáveis’, diz líder de manifestação por mais liberdade na ilha
Após a 44ª tentativa de completar a ligação, Yunior García finalmente atendeu do outro lado, em Havana
“Desculpe, só às vezes tenho sinal no telefone”, explica o dramaturgo e ativista de 39 anos, que nos últimos tempos se tornou a face mais visível da oposição em Cuba.
Na véspera, a BBC News Mundo (serviço em espanhol da BBC) ligou para ele de números diferentes 56 vezes nos dois dias anteriores. “Também estou sem internet, acho que estão tentando me manter incomunicável.”
Para ele, os problemas com seu telefone são uma das muitas medidas que as autoridades cubanas tomaram desde que García criou uma plataforma de oposição chamada Arquipélago e convocou “uma marcha cívica pela mudança”.
Em ação inédita, o grupo pediu autorização em várias províncias para a realização de um protesto, inicialmente marcado para 20 de novembro, com base em um artigo da Constituição, em um país onde a oposição não é tolerada.
O governo cubano anunciou então exercícios militares e um “Dia da Defesa Nacional” para a mesma data, fazendo com que García e os demais integrantes do Arquipélago (grupo coordenado por 30 pessoas com diversos cargos político) decidissem seguir adiante com a convocatória para a manifestação nesta segunda-feira (15/11).
“Nos negaram a autorização e, ao nos mantermos firmes na demanda pelo reconhecimento do direito de marchar, que é um direito humano e constitucional, essa campanha contra nós se acentuou”, diz García.
As autoridades cubanas dedicaram longos espaços em seus meios de comunicação oficiais para qualificar a convocação da marcha como “tentativa de desestabilização” e “provocação”.
Consideram que o movimento é “organizado e financiado pelos Estados Unidos” e descrevem Garcia como “um líder criado por manuais” que “busca um confronto entre o Exército e o povo” e que “recebe financiamento” de seus “senhores do Norte.”
A partir de relatos anônimos que circularam em redes sociais, os cubanos foram advertidos a não tomar as ruas no dia 15/11 sob ameaça de serem reprimidos com porretes, como aconteceu nos protestos de 11/07.
O presidente cubano, Miguel Díaz-Canel, garantiu em rede nacional que estão “alertas” e “preparados” para “defender a revolução”.
É uma situação totalmente inédita e um cenário desconhecido em um país onde até recentemente protestos contra o governo eram simplesmente inimagináveis.
Durante o fim de semana, vários ativistas denunciaram prisões, intimações para interrogatórios na polícia, ameaças e advertências. A equipe da agência de notícias espanhola EFE teve seu credenciamento de imprensa revogado.
Neste domingo (14), dois dias após a entrevista abaixo, García divulgou um vídeo em que afirma que sua casa foi cercada por manifestantes para impedi-lo de protestar.
A BBC News Mundo entrevistou García sobre a convocação dos protestos para 15/11, as denúncias do governo contra ele e os possíveis cenários que a ilha enfrenta diante da potencial marcha desta segunda-feira.
BBC News Mundo – No dia 11/07, vimos uma mobilização sem precedentes em Cuba e também vimos uma repressão sem precedentes. Ainda há, de fato, muitas pessoas presas. Por que então convocar outra marcha se o resultado pode ser o mesmo?
Yunior García – Ao longo dos anos, o regime cubano tem tentado sempre colocar máscaras, especialmente perante a comunidade internacional e perante uma certa esquerda internacional: dizer que eles são um Estado de direito, dizer que há uma democracia na Cuba.
Depois de 11/07, o próprio presidente do Supremo Tribunal Federal saiu em entrevista coletiva para dizer que em Cuba o direito de manifestação é respeitado e que os cubanos têm o direito de se manifestar, desde que o façam de maneira cívica e pacífica.
Foi então que nós, apegados a isso e a um artigo da Constituição onde esse direito é reconhecido, decidimos tentar esgotar esse recurso, ir por essa via ou, pelo menos, obrigá-los a retirar todas as suas máscaras.
E acreditamos que, nesse sentido, essa iniciativa já foi uma vitória retumbante, porque tiveram que mostrar ao mundo o que realmente são.
BBC News Mundo – O que você quer dizer?
García – Como resultado da convocação, o próprio presidente reconheceu que em Cuba não há divisão de poderes.
Os Municípios (governos provinciais) declararam ilegal o direito de protestar e o Ministério Público ameaçou-nos diretamente de prisão se insistirmos na defesa deste direito.
Em outras palavras, de todas as maneiras possíveis, eles demonstraram ao mundo que Cuba é uma ditadura, que não há democracia de nenhum tipo e que provavelmente, se formos rigorosos, nem mesmo haverá República.
BBC News Mundo – Você trabalhou durante anos para instituições governamentais cubanas, atuou e escreveu para produções televisivas estatais, assinou uma carta ao presidente americano Joe Biden contra o embargo dos EUA e agora usa palavras como “ditadura” ou “regime” para se referir ao governo de seu país, termos que dividem dentro e fora de Cuba. Por quê?
García – A questão do idioma é muito complexa. Sempre quis usar uma linguagem diferente, que não fizesse parte da retórica de um lado ou do outro. Mas há palavras que simplesmente não têm substitutas.
Eles mostraram claramente que se comportam como uma ditadura e que nem se importam mais em manter as aparências.
E, como escrevi recentemente, há palavras que você não ousa mencionar até que as veja nuas na sua frente.
Realmente esgotei todos os recursos que existem em Cuba para tentar conseguir mudanças por meio do que eles chamam de “canais estabelecidos”.
Participei de congressos, assembleias, em que estive diante das figuras que governam Cuba e fui transparente e vocal, e minha experiência de vida me mostrou que nada se transforma por esses caminhos. Absolutamente.
Em Cuba, temos assembleias e congressos com uma certa aparência de diálogo democrático que, na realidade, nada mais são do que salas de socorro, onde as pessoas liberam suas dores e ano após ano as mesmas perguntas, as mesmas preocupações e todos os problemas se repetem.
BBC News Mundo – Depois de uma declaração que você publicou no Facebook, em que diz que marchará apenas no domingo em vez de segunda-feira, muita polêmica foi criada sobre se isso significa que a manifestação foi cancelada.
García – O que publiquei foi devido a uma preocupação real que tenho, devido às informações que nos chegaram, de que, aparentemente, estavam preparados para nos esperar nos lugares onde havíamos anunciado que faríamos demonstrações com armadilhas que constituíam verdadeiras ratoeiras .
Nesse sentido, disse que manifestaria apenas no domingo (14) para renovar essa reivindicação do direito de protestar, mas em nenhum lugar da declaração havia a palavra para cancelar ou eliminar ou suspender ou adiar.
Eu sabia que eles planejavam organizar uma espécie de carnaval infantil na mesma área onde tínhamos planejado a marcha, e isso foi demais para mim.
Também sabíamos do perigo de infiltrados, de coisas que eles poderiam preparar em locais como creches, hospitais e outros semelhantes para tentar culpar os manifestantes.
Diante de toda essa preocupação, no meu caso pessoal, acreditei que devíamos fazer um apelo à não violência e aos manifestantes para buscarmos alternativas que não coloquem suas vidas em risco.
Porque o outro perigo que existe, que é real, é que os líderes, as pessoas visíveis, podemos ser parados a qualquer momento e então estaríamos de alguma forma mandando as pessoas para um lugar onde não poderíamos estar.
Essas preocupações realmente me assombravam e eu precisava encontrar uma solução que ao mesmo tempo minimizasse os riscos de violência, mas que não significasse nada, desligar ou privar as pessoas do direito de se manifestarem.
BBC News Mundo – Mas com esses precedentes, você acha que é responsável continuar?
García – É por isso que me cabe esta afirmação, que é antes de mais nada um apelo ao bom senso e ao equilíbrio entre as partes. Em segundo lugar, é um apelo a soluções engenhosas para evitar colocar os manifestantes em risco.
Em Cuba, existe um ditado que diz “el que empuja no se da golpe” (quem empurra não bate, em tradução livre). Pois bem, em nenhum momento, em qualquer caso, gostaria de fazer parte desse ditado, para o caso de me prenderem e eu não poder estar lá (na manifestação).
Portanto, o que faço é apelar às pessoas que busquem a engenhosidade para defender esse direito, mas em nenhum caso isso significa privar os cubanos de conquistar aqueles direitos que nos negaram.
BBC News Mundo – Após o protesto ocorrido em 27 de novembro de 2020 em frente ao Ministério da Cultura de Cuba, você foi um dos que defendeu o diálogo, mesmo quando outros participantes se opuseram a ele. Você se encontrou com o músico Silvio Rodríguez. Se a marcha corre esses riscos, por que não continuar apostando no diálogo? Você acha que um diálogo com as autoridades cubanas é possível?
García – Acredito que o diálogo é uma solução política viável. O grande problema do diálogo com as autoridades é que nunca aconteceu, porque nos encontramos diante de um governo que se nega a dialogar.
Eles não se interessam pelo diálogo porque não estão preparados para isso, porque seja qual for o diálogo a que se submetam, seja real, seja transparente, eles sabem que vão perder.
As perguntas a serem feitas também são: que tipo de diálogo e em que circunstâncias?
O único resultado real de um diálogo para mim é aquele em que envolvemos o resto da sociedade, no qual a sociedade civil cubana começa a participar, para que o povo cubano possa decidir o que quiser.
BBC News Mundo – Então, você concorda com a afirmação feita sobre você na mídia oficial cubana de que está em busca de uma mudança no sistema?
García – Não creio que seja legítimo que um único ser humano possa mudar o sistema de um país, como já aconteceu aqui.
Acho que deve ser uma decisão soberana do povo. Em outras palavras, são os povos que têm o direito legítimo de mudar a realidade concreta de sua nação.
Eu sou um revolucionário no verdadeiro sentido da palavra. Então, é claro que quero mudar minha realidade. E isso implica dar poder ao povo, para que o povo, sem exclusões, mude a sua realidade.
O que luto não é para impor o que acredito que será o melhor país para todos. Quero que as pessoas tenham a possibilidade de decidir qual é o melhor país para Yunior.
BBC News Mundo – E como é esse país melhor para Yunior? Qual é a Cuba pela qual você quer marchar no dia 14? Qual é o país pelo qual você convocou para marchar no dia 15?
García – A Cuba com que sonho, como disse, é a Cuba da liberdade consensual, um Estado de direito onde a legalidade é verdadeiramente respeitada e a lei não é interpretada a favor do poder. Um país onde as liberdades não são usurpadas por um grupo privilegiado.
Tem que ser um país com uma democracia real e participativa, onde as pessoas tenham o poder de transformar sua realidade concreta. Tem que ser um país próspero, onde haja liberdade para que as pessoas possam crescer economicamente, em prosperidade, sem criar abismos intransponíveis entre si.
O futuro de Cuba deve ser inclusivo, devemos acabar com toda a discriminação que ainda existe de muitas maneiras.
Tem que ser um país onde as minorias sejam respeitadas, onde todos participemos, onde todos tenhamos a liberdade de fazer e dizer o que pensamos sem parar na prisão ou no exílio, um país, como Martí (o herói nacional de Cuba), “com todos e para o bem de todos” e que isto não se transforme num slogan fácil, mas sim numa prática cotidiana.
BBC News Mundo – Além de buscar promover uma mudança no sistema, nas últimas semanas, os meios de comunicação oficiais da ilha têm usado amplos espaços para falar de você e também para alertar que você ser “um líder criado por manuais”, que recebe pedidos dos Estados Unidos, ou de ser um agente da CIA. O que você tem a dizer?
García – É curioso que essas acusações sejam feitas contra mim publicamente e que, em privado, nos interrogatórios a que me submeteram, que, como podeis imaginar, foram muitos e variados, nem sequer me perguntaram nada.
Eles nunca me deram a mínima ideia de um relacionamento com os EUA ou de um relacionamento com pagamentos ou financiamentos de qualquer lugar, porque sabem que isso é falso. Eles nunca foram capazes de provar um único centavo para mim.
BBC News Mundo – Como o movimento Arquipélago se financia?
García – O que fazemos não exige fundos nem o fazemos por dinheiro. Na verdade, quando estávamos começando, alguém publicou um tuíte pedindo doações para o Arquipélago e depois o deletou e se desculpou porque sabemos que qualquer problema com dinheiro pode ser usado contra nós.
Em Cuba, temos que aprender a parar de pensar que, por não concordar com o governo, você recebe dinheiro da CIA.
Fazemos tudo isso porque já não suportamos o fato de viver num país sem direitos, porque já não suportamos mais que a única esperança que um jovem cubano tem é de pedir um visto e sair do país.
Não aguentamos mais a questão da economia, que não se conserta, nem das pessoas desesperadas que fazem fila em frente às lojas vazias.
BBC News Mundo – E qual é o seu papel nisso tudo? O que você procura pessoalmente: reconhecimento, destaque, tornar-se uma figura política, poder diante de uma mudança potencial…?
García – Não tenho aspirações políticas e quem me conhece sabe disso, nem mesmo no meu grupo de teatro quis assumir responsabilidades (a direção geral do meu grupo de teatro era alternada entre os atores, com votações anuais). O poder não é algo que me move.
O que acontece é que me posicionar diante da minha realidade é inevitável para mim.
Tenho procurado expressar minhas ideias em minhas peças e encenações, em quase tudo que tenho escrito como artista e há quem me diga que devo continuar fazendo isso.
Mas às vezes não é suficiente. Eu acredito que um intelectual tem que se envolver com a realidade de seu país.
Meu papel em tudo isso então sempre foi o de um artista e um intelectual comprometido com sua realidade, que não quer ficar confortável em seu sofá, escrevendo obras ou diálogos que refletem indiretamente o que está acontecendo.
Não se trata de amanhã ir parar em um livro de história ou receber um prêmio póstumo ou ter uma rua com o seu nome. Trata-se de mudar sua realidade. É fazer algo pelas pessoas, não pelo seu nome, não pela posteridade, não pela história.
BBC News Mundo – Como você tem vivido e como sua família tem vivido o processo de convocação deste protesto e a reação do governo a ele?
García – Aconteceu de tudo. Desde ameaças diretas à segurança pelo Estado ou pelo Ministério Público até pombos mortos com sangue na porta de minha casa ou ato de repúdio (pessoas que são convocadas em Cuba para gritar ofensas aos adversários).
Como você pode ver, eles desligaram meu telefone de forma intermitente e eu não tenho internet. Eles também assediaram familiares, minha sogra, minha cunhada ou qualquer pessoa próxima a mim. E, durante semanas, fui foco de frequentes campanhas de descrédito na mídia estatal, sem direito a resposta.
É emocionalmente difícil para mim. Tenho o peso da preocupação de minha mãe, que diz que não consegue dormir de ansiedade, ou de minha irmã que mora fora de Cuba e que está ainda mais desesperada porque se sente desamparada e não sabe o que fazer.
BBC News Mundo – Por que você acha que o governo de Cuba reagiu desta forma por causa de apenas um pedido de protesto?
García – É um governo que controla todas as instituições, todo o aparato jurídico, todas as Forças Armadas, todas as armas, todo o dinheiro … Somos um grupo de jovens com um telefone.
Quando tal regime estremece diante de um grupo de meninos que só têm suas ideias e seus celulares, é porque têm a certeza de que já perderam a maioria da população.
Não há outra explicação.
Eles sabem que agora não têm aquele apoio de que falam há anos.
Depois do desastre da Tarefa Ordenadora (reforma da economia que acabou com alta inflação), a pandemia, tudo o que o povo cubano viveu nos últimos anos, você vê que se fala do embargo enquanto os hotéis continuam crescendo e importando carros para o turismo. É muito difícil continuar a confiar neles.
Eles sabem disso, e é por isso que estão tremendo.
BBC News Mundo – Em que medida acha que artistas como você, jovens com telefone como disse, podem alcançar demandas que os grupos de oposição não alcançam há décadas?
García – Você não pode mudar nada em um país sem o apoio do povo. Em outras ocasiões, talvez fosse muito difícil obter apoio porque não havia meios de comunicação.
Às vezes, os adversários eram mais conhecidos no exterior do que no país inteiro. O contexto era diferente.
Agora a realidade mudou. O que faz a diferença nesse momento é que as pessoas têm mais acesso à informação, podem entender melhor o que está acontecendo e podem tomar um pouco mais de decisão para apoiar ou não uma proposta, uma iniciativa ou um movimento.
Acredito que as mudanças vão depender de as pessoas concordarem que precisam fazer algo para mudar sua realidade. E acredito que essa mudança já esteja ocorrendo, pelo menos nas consciências.
BBC News Mundo – E por que você acha que isso está acontecendo agora? Que outras condições poderia haver além do acesso à informação ou às redes sociais?
García – Hoje, vivemos uma crise total em Cuba. Não é mais nem econômica. É uma crise em todos os sentidos: cultural, de comunicação, moral… E em meio a uma situação como essa podem ocorrer mudanças importantes.
Há também uma crise de liderança em termos de governante. Erros de comunicação terríveis e um governo que não para de errar. E isso também, é claro, influencia as pessoas a perderem a fé ou a confiança em você.
Outras vezes havia outras lideranças autoritárias, mas pelo menos tinham carisma e a simpatia de grandes segmentos da população. Agora não.
Agora são pessoas sem liderança real, que não têm nenhum tipo de histórico verdadeiramente revolucionário, que se esqueceram do conceito real do que significa revolução. São conservadores de manual, continuístas, que votam por unanimidade, têm a mesma linguagem e não são mais capazes de inspirar ninguém.
E, é claro, as pessoas não gostam de coisas assim.
BBC News Mundo – Mas isso não acontece só no nível oficial. Por que você acha que Cuba não teve um líder da oposição capaz de inspirar e mobilizar amplos setores?
García – Em Cuba, sempre semeamos desconfiança nos demais cubanos. Nós, cubanos, desconfiamos de todos: qualquer um pode ser um infiltrado das forças de segurança, um policial.
Há muito semeiam essa desconfiança uns nos outros, e nós a carregamos em nossos genes.
Também existe o medo do caudilhismo, porque o sofremos de forma brutal, e as pessoas costumam rejeitar quem tem uma liderança porque pode se tornar o próximo caudilho.
Mas acredito que existem outros líderes da oposição que vieram antes e que não podem ser esquecidos. São muitas as pessoas que tentaram conseguir mudanças em Cuba e também não podem ser esquecidas. As aldeias, às vezes, têm memória ruim.
BBC News Mundo – As vozes da oposição que se tornaram mais relevantes nos últimos tempos acabaram presas ou no exílio. Na verdade, Luis Manuel Otero Alcántara e Maikel Osorbo, membros do Movimento San Isidro, ainda estão presos. Como você encara essas duas possibilidades?
García – Acho que o fato de os adversários em Cuba acabarem na prisão ou no exílio mostra mais uma vez o tipo de governo que temos.
A prisão para mim não é apenas uma ameaça, é praticamente uma realidade próxima a cada segundo que passa.
Já me falaram dos crimes de que me acusarão se eu for à passeata. E ontem, durante um interrogatório, até me falaram sobre a prisão para onde vou (o Combinado del Este, em Havana) e as condições em que estarei lá.
Por isso, procuro viver cada dia como se fosse o último, à noite faço amor com minha esposa como se fosse a última vez, porque não sei qual será meu último dia de liberdade.
Em relação a um potencial exílio, é claro para mim que a prioridade para mim não será o que é melhor para o meu conforto, como eu agrado meu ego ou minhas aspirações pessoais, mas de que lugar posso ser mais útil para meu país, de onde posso servir melhor ao futuro de Cuba.
E no meu caso pessoal, prometo que esta é a pergunta que me coloco todos os dias ao tomar uma decisão.
BBC News Mundo – Você disse que marchará neste domingo por uma das avenidas mais centrais de Havana com uma rosa branca. Você já pensou que provavelmente nem consegue chegar lá? O que acontecerá com a marcha de 15/11 se te prenderem? Quais são os cenários?
García – Não sei o que vai acontecer. Eu sei o que decidi o que vou fazer, o que quero fazer. E também sei que tenho confiança e fé no povo cubano. Tenho fé nos jovens. Acredito nesta geração e acredito que esta geração é outra, que Cuba mudou e que o cenário é totalmente diferente.
Não posso saber o que vai acontecer no domingo ou na segunda-feira ou no resto dos dias, mas sei que a minha decisão é sair e manifestar, defender, conquistar um direito. A atitude de uma pessoa pode mudar o mundo, como fez Rosa Parks. E eu acredito nisso.
BBC News Mundo – E se ninguém sair, se a ligação falhar? O que vai acontecer a seguir?
García – As mudanças em Cuba são imparáveis, aconteça o que acontecer nos próximos dias. Este é apenas mais um episódio. Esta é uma roda que começou a girar. Será o Arquipélago? Será outro movimento? Serão outros jovens? Poderia ser de outras maneiras e espero que seja sempre pacífico? Não sei, mas o que estou convencido é que não há quem o impeça.