Internacional
Meloni tenta se distanciar do fascismo em primeiro discurso
À Câmara dos Deputados, nova primeira-ministra da Itália nega ter simpatia por regimes antidemocráticos, garante lealdade à Otan e diz que não sabotará União Europeia
Em seu primeiro discurso à Câmara dos Deputados, a nova primeira-ministra da Itália e líder do partido de extrema direita Irmãos da Itália (FdI), Giorgia Meloni, tentou nesta terça-feira (25/10) se distanciar do fascismo e outros regimes antidemocráticos.
“Nunca tive qualquer simpatia ou proximidade com regimes antidemocráticos, incluindo o fascismo”, afirmou Meloni, que começou a sua carreira política nas alas jovens do partido pós-fascista Movimento Social. Numa entrevista dada quando tinha 19 anos, ela chegou a defender Benito Mussolini, afirmando que o fascista foi “um bom político” e que “tudo o que fez, fez pela Itália”.
No presente discurso, Meloni disse que seu governo – o primeiro de extrema direita na Itália desde a Segunda Guerra Mundial – não se desviará “nenhum centímetro” dos valores democráticos e lutará “contra qualquer forma de racismo, antissemitismo, violência política e discriminação”.
Ela garantiu ainda que seu governo não pretende sabotar a União Europeia (UE), “mas sim fazê-la mais eficaz”. Meloni agradeceu as mensagens que recebeu das principais instituições europeias e explicou que sabe que há “curiosidade” sobre a atuação do governo em relação ao bloco comunitário.
A nova premiê frisou que “quem se coloca questões interrogativas não é um inimigo ou um herege, mas sim um pragmático que não tem dizer quando algo não funciona como poderia”. O objetivo do novo governo, que liderará a partir da aliança com os ultradireitistas Liga e Força Itália, será “não frear ou sabotar a UE, mas sim torná-la mais eficaz na resposta às crises”, e garantiu que seu país respeitará “as normas atualmente em vigor” em matérias orçamentárias.
“A Itália fará ouvir sua voz na Europa como convém a uma grande nação fundadora. A UE não é um círculo de elite, com membros da série A e da série B, ou uma diretoria que deve manter suas contas em ordem, mas sim uma casa comum para encarar objetivos que os países-membros dificilmente poderão enfrentar sozinhos. Nesse ponto, a UE muitas vezes não esteve preparada”, apontou Meloni.
Lealdade à Otan
A chefe de governo também garantiu que a Itália seguirá sendo um aliado leal da Otan e, citando o “valente povo ucraniano”, confirmou que serão respeitados os compromissos internacionais para ajudá-los a “se defenderem da agressão da Rússia”.
“Aqueles que acreditam que é possível trocar a liberdade da Ucrânia por nossa liberdade, estão errados. Ceder à chantagem de Vladimir Putin não resolveria o problema”, destacou, lembrando que a Itália enfrentará tempos difíceis devido à guerra.
No discurso que durou mais de uma hora, Meloni falou ainda sobre o peso de ser a primeira mulher a governar a Itália e agradeceu a todas “que passam por dificuldades para fazer valer seu talento”, e relembrou as que “construíram essa escada que hoje permite romper esse pesado teto de vidro”.
Interrompida várias vezes por aplausos, Meloni confirmou a intenção de entrar em acordo com a Comissão Europeia, para ajustes necessários no programa de recuperação para a utilização dos fundos europeus, a fim de “otimizar o gasto, sobretudo, diante do aumento dos preços das matérias-primas e da crise energética”.
Ela destacou ainda que pedirá ajuda ao bloco europeu para “travar as saídas ilegais” de migrantes de África com destino à Itália. ao mesmo tempo que assegurou não pretender “questionar o direito de asilo daqueles que fogem da guerra e da perseguição”. Porém criticou o que chamou de “incapacidade de encontrar soluções adequadas” para as crises migratórias.
A Itália é uma das principais portas de entrada de migrantes que cruzam o Mar Mediterrâneo em direção à Europa. Meloni disse que pretende acabar com as chegadas ilegais e o tráfico humano no país e defendeu que os pedidos de asilo sejam feitos nos países de origem.
Reforma constitucional
A nova primeira-ministra expôs a intenção de uma reforma da Constituição da Itália, com a introdução do semipresidencialismo, em que o chefe de Estado seja eleito pelos cidadãos, e defendeu a discussão entre todas as forças políticas nacionais.
Ela ressaltou ainda que seu governo não pretende restringir as liberdades já existentes no país, na questão de direitos civis e aborto.
Depois do discurso, a chefe do Executivo italiano será submetida ao longo do dia a um voto de confiança, um requisito para a posse. Por possuir maioria na Casa com a coalizão de governo, ela deverá ter uma votação favorável. Na quarta-feira, Meloni discursará no Senado, onde ocorre uma votação análoga.