Internacional
Indonésia veta exportar minérios para atrair investimentos
Rico em reservas de níquel, bauxita, cobre, estanho e carvão, país proibiu exportação de matérias-primas. Estratégia visa estimular a indústria local, e já mostrou alguns resultados
Para reduzir a dependência de matérias-primas da China ou da Rússia, a Alemanha busca novos fornecedores – esse foi um dos objetivos do recente giro do chanceler federal alemão, Olaf Scholz, pela América do Sul, que incluiu uma visita ao Brasil.
No entanto, não são todos os países ricos em matérias-primas que estão dispostos a exportá-las. Durante muito tempo, os países industrializados lucraram comprando insumos baratos no exterior para transformá-los em produtos de alta qualidade, que são depois exportados por um valor bem maior.
Não é só a China que acordou para esse modelo. Em vez de ser apenas a bancada de trabalho do mundo, o país asiático desenvolveu sua indústria para produzir bens de valor mais elevado. Outros países estão seguindo esse exemplo, como a Indonésia.
Embora a economia indonésia tenha crescido constantemente nos últimos 20 anos, o país emergente segue estruturalmente em grande parte em um nível baixo. “O setor exportador da Indonésia foi muito dominado no passado por matérias-primas”, afirma Jan Rönnfeld, diretor da Câmara de Comércio Alemã no Exterior (AHK) na Indonésia, ao citar um dos motivos desse cenário.
O país possui grandes reservas de níquel, bauxita e cobre. Além disso, a Indonésia é o maior exportador do mundo de óleo de palma, estanho refinado e carvão mineral.
O presidente indonésio, Joko Widodo, não quer mais apenas fornecer matérias-primas. Seu objetivo: até 2045, a Indonésia deve entrar para o grupo dos países industrializados.
Em 2014, o país já proibiu a exportação de minérios, afirma Frank Maleuris, da Germany Trade and Invest (GTAI), uma agência de marketing em Jacarta ligada ao governo alemão. A proibição visava forçar o processamento de insumos no próprio país, realizado por empresas locais ou investidores estrangeiros. Porém, segundo Maleuris, esse banimento tinha muitas lacunas.
Por isso, o governo reforçou as regras para a exportação de matérias-primas. Desde o início de 2020, quem deseja níquel, deve investir e processar o mineral no país. Nesse quesito, a Indonésia não consegue ser contornada com facilidade, pois possui as maiores reservas de níquel do mundo, e o metal é fundamental para o refinamento do aço e em baterias de carros elétricos.
Para abrir caminho a potenciais investidores, a Indonésia flexibilizou suas leis sobre investimento e as normas trabalhistas em 2021, abrindo centenas de setores econômicos à propriedade estrangeira.
Dependência da China deve continuar
“Então aconteceu o que o governo esperava. Empresas estrangeiras chegaram ao país”, afirma Malerius. Segundo o governo indonésio, nos seis primeiros meses de 2022, foram atraídos ao todo 21,6 bilhões de dólares em investimento estrangeiro direto – quase 40% a mais do que no mesmo período do ano anterior.
“Principalmente empresas chinesas construíram aqui fundições e siderúrgicas”, diz Malerius, acrescentando que, nos últimos três ou quatro anos, o país tornou-se um dos maiores exportadores de aço – principalmente aço inoxidável. O especialista estima que a Indonésia tenha potencial para exportar cerca de 20 bilhões de dólares de aço neste ano – exportação que há cinco ou seis anos praticamente não existia.
Para terem acesso ao tão cobiçado níquel, Volkswagen, Ford e Tesla também gostariam de se tornar ativas na Indonésia. “Mas para elas será difícil encontrar cadeias de suprimentos nas quais os chineses não estejam de alguma foram envolvidos”, afirma Malerius, ressaltando que isso provavelmente será possível apenas em cooperação com empresas chinesas.
Bom para a Indonésia. Mas, sob uma perspectiva da Europa, permanece a dependência da China.
Europa corre atrás
A Europa não gostou, é claro, das medidas indonésias. A União Europeia (UE) apresentou uma queixa junto à Organização Mundial do Comércio (OMC), alegando que a proibição de exportação de níquel não se enquadra nas regras do livre comércio mundial. Em novembro de 2022, a OMC deu ganho de causa ao bloco europeu. A Indonésia apelou da decisão, e anunciou ainda a intenção de formar um cartel com outros países que exportam insumos para baterias, nos moldes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (OPEC).
Para garantir o acesso ao níquel, a empresa química alemã BASF e a mineradora francesa Eramet anunciaram a construção de uma fábrica de níquel-cobalto na Indonésia para o mercado de baterias de carros elétricos – um investimento de cerca de 2,4 bilhões de euros. O acordo está prestes a ser finalizado. A nova fábrica deve iniciar sua produção no início de 2026.
Widodo não fechou as portas somente para o níquel. Ele quer trazer para o país a indústria de processamento de bauxita, cobre e estanho. A partir de junho, será proibida a exportação de minério de bauxita. A Indonésia é um importante exportador desse minério, usado na produção de alumínio, e, portanto, na fabricação de aviões e automóveis.
A partir de 2024, estanho não poderá ser mais exportado. Atualmente, o país é o segundo maior produtor de estanho do mundo. A Indonésia ainda exporta 60% da demanda mundial de óleo de palma, e o país também já colocou limites a essa venda.
Incentivo à indústria
No futuro, o país quer construir uma indústria nacional de terras raras. Segundo a agência de notícias estatal Antara News, os depósitos de matérias-primas críticas devem ser mapeados e um conceito para essa exploração deve ser desenvolvido. A Indonésia ainda importa terras raras para suprir a demanda de sua indústria de tecnologia verde.
“Apesar de estar distante, há potencial para empresas alemãs em muitas áreas na Indonésia”, opina Rönnfeld. “Com quase 300 milhões de habitantes, há, na realidade, potencial em todos os setores.”
Cerca de 100 milhões de indonésios pertencem à classe média. Em relação à população, a Indonésia é o quarto maior país do mundo. Segundo Rönnfeld, os setores de construção de máquinas e de instalações, além do de tecnologia médica, podem se beneficiar disso, assim como a indústria de transformação, que cresceu relativamente pouco no país nas últimas duas décadas.
Até agora, sobretudo, chineses, japoneses e sul-coreanos investiram no país. A Alemanha enviou tecnologia em vez de investir. Mas isso pode mudar. “Com certeza, haverá mais investimento do lado europeu. Ainda que a Indonésia não seja um mercado fácil”, opina Rönnfeld.
Segundo ele, a entrada nesse mercado ainda é relativamente difícil, apesar da flexibilização de normas. “Mas normalmente trata-se da relação entre risco e lucro em decisões empresariais. E a Indonésia oferece a possibilidade de grandes lucros, pois em muitos setores há pouca concorrência. Em alguns setores, 90% dos produtos são importados.”