Nacional
Projeto que flexibiliza licenciamento será alvo da Comissão de Meio Ambiente
Jaques Wagner (no telão) na reunião em que foi eleito presidente da comissão, em fevereiro
Jaques Wagner (no telão) na reunião em que foi eleito presidente da comissão, em fevereiro
A Comissão de Meio Ambiente (CMA) do Senado volta a se reuniu nesta quarta-feira (2), agora sob a gestão de Jaques Wagner (PT-BA), que conduzirá o colegiado até janeiro de 2023. Na reunião, com início às 14h30, a comissão deve votar um requerimento de Veneziano Vital do Rêgo (MDB-PB) que pede que a CMA promova audiência pública sobre um projeto de lei, aprovado recentemente na Câmara dos Deputados, que define um novo marco regulatório para o licenciamento ambiental (PL 3.729/2004). A proposta deve ser analisada agora pelo Senado.
“A matéria é de suma importância, pois tem como objetivo central a simplificação e celeridade do processo de licenciamento — inclusive o dispensando em casos de empreendimentos de ‘utilidade pública ou interesse social’. Assim, a fim de que a necessária otimização dos processos de licenciamento não se torne motivo de descumprimento de normas ambientais, ou relaxamento na fiscalização de seu cumprimento, sugerimos que o Senado, através de seu colegiado especializado, se debruce detidamente sobre a matéria através de audiência pública”, propõe Veneziano.
Em entrevista recente à Agência Senado, Jaques Wagner explicitou que, no seu entender, a CMA deve não só debater, mas deliberar sobre o PL 3.729.
— Precisamos ter uma tramitação que valorize o tema e o Senado. É impossível querer aprovar a toque de caixa. Independente se é ambientalista ou produtor, precisamos acabar com essa dicotomia; o que a gente precisa é de desenvolvimento com sustentabilidade ambiental — disse Wagner, que defende que o relator do projeto seja um senador vinculado à CMA.
A pedido de Jean Paul Prates (PT-RN), a CMA também deve analisar os impactos ambientais da medida provisória que trata da privatização da Eletrobras (MP 1.031/2021). O senador quer uma audiência reunindo, entre outros, o ex-ministro das Minas e Energia Nelson Hubner; o ex-presidente da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), que faz parte da holding Eletrobras, Mozart Arnaud; o ex-presidente da Agência Nacional de Águas (ANA) Vicente Andreus; e o ex-presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), vinculada ao Ministério das Minas e Energia, Maurício Tolmasquim.
Para o senador, é preciso um olhar mais detido sobre a questão, “capaz de traçar conexões entre a infraestrutura do sistema elétrico nacional e a proteção ambiental”. Jean Paul argumenta que o desmatamento impacta o ciclo hidrológico responsável pelas chuvas e pela regulação do clima em grande parte do país e lembra que, entre as muitas consequências ruins dessa prática, está a menor vazão de alguns rios.
“A capacidade de geração de energia em muitas hidrelétricas já sofre o impacto da redução da quantidade de água que chega aos reservatórios. Não por acaso, o nível de água em hidrelétricas do Sudeste e Centro-Oeste ficou abaixo da média histórica pelo quinto ano consecutivo. A conjunção de erros de planejamento com desmatamento tem provocado maior necessidade de despacho de usinas térmicas para compensar a menor capacidade de geração das hidrelétricas. A geração térmica é mais cara que a hidrelétrica, e mais poluente. Ao mesmo tempo, a contratação de pequenas hidrelétricas tem apresentado preços superiores aos das energias eólica e solar”, adverte Jean Paul.
Também nesta quarta-feira, a CMA oficializará a política pública a ser analisada pelo colegiado em 2021. Jaques Wagner defende que a comissão se debruce sobre a atuação do governo em políticas de combate ao desmatamento e prevenção e controle de incêndios florestais.
Wagner se vale de dados oficiais do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), referentes a 2020, para concluir que a ação do governo no combate a desmatamentos e queimadas é “desastrosa”. Ele diz que foram 9,8 mil quilômetros quadrados desmatados na Amazônia, a segunda maior área desmatada nos últimos 9 anos, ficando atrás apenas do ano de 2019, e ressalta que 99% do desmatamento foi ilegal, em terras públicas, sem autorização.
“Os desmatamentos em unidades de conservação e terras indígenas, em 2019 e 2020, foram os maiores desde 2008. Os dados do Deter, sistema de alertas de desmatamento na Amazônia, mostraram os maiores números para 2019 e 2020, com 9.176 km² e 8.426 km², respectivamente as maiores taxas desde o início do monitoramento, em 2015 (o terceiro maior número foi 6.302 km² em 2016). O total de focos de queimadas, também monitorados pelo Inpe, indicam que o ano de 2020 obteve o maior número de focos de queimadas desde 2011. No último ano, foram 33 mil quilômetros quadrados incendiados no Pantanal, 14% do bioma apenas no mês de setembro. Estudos apontam que a área queimada em 2020 supera em 10 vezes a área de vegetação natural perdida em 18 anos”, alerta.
Para o senador, esse quadro é fruto de uma estratégia deliberada de leniência no combate a desmatamentos. Ele cita ainda que, mesmo diante de tal crescimento nas taxas e alertas de desmatamento, há queda na aplicação de multas pelo Ibama.
“Em 2019, segundo o Observatório do Clima, a redução foi de 25% nas autuações comparados com 2018. E em 2020, só no comparativo do primeiro semestre, as multas tiveram queda de 54% em relação ao mesmo período de 2019. Até outubro de 2020, somente três multas haviam sido pagas do total de mil autuações feitas ao longo do ano, representando R$ 12,5 mil. O conjunto na falta de aplicação e cobrança das multas por desmatamento evidencia a leniência frente a esses crimes”, denuncia.
O avanço do garimpo ilegal também é outra situação estrutural para a qual o país ainda não tem dado a devida atenção, segundo o presidente da CMA. Ele afirma que o biênio 2019-2020 registrou recordes mensais de desmatamento para atividades de mineração em unidades de conservação na Amazônia, com o primeiro trimestre de 2020 atingindo taxa 80,6% maior que a do mesmo período em 2019.
“Cerca de 70% do avanço da mineração se dá sobre áreas protegidas, com as terras indígenas acumulando aumento de 64% durante o mesmo trimestre. Isso sobre o ano-base em que o recorde de 23% de desmatamento via garimpo ilegal havia se estabelecido previamente em 2019, área equivalente a 10 mil campos de futebol”, argumenta.
O presidente da comissão destaca ainda que não há relação entre aumento do desmatamento e aumento da produtividade agrícola, pois em 2010, quando o Brasil crescia 3% ao ano e a agricultura 2%, o desmatamento caiu 80%. Para Wagner, é preciso trabalhar a “verticalização da agricultura”, aumentando a produtividade sem novos desmatamentos.
“A produtividade média de carne, em 2015, foi de 45 kg por hectare, mas pode ultrapassar 200 kg por hectare em pastagens bem manejadas”, defende o senador baiano, citando relatório da Coalizão Clima, Florestas e Agricultura.