Saúde
Médicos desenvolvem guia para tratar alergias alimentares
Pesquisadores lançam diretrizes inéditas para a imunoterapia oral em crianças, padronizando tratamento aplicado desde 1908
Pesquisadores lançam diretrizes inéditas para a imunoterapia oral em crianças, padronizando tratamento aplicado desde 1908
Alergias alimentares podem ser um grande pesadelo para as crianças: cada refeição escolar ou festinha de aniversário pode representar um risco potencial à saúde. O estresse e a ansiedade que isso causa aos pequenos e aos pais podem ter um impacto enorme na vida social cotidiana da família e no planejamento de viagens e festas.
Agora, pesquisadores desenvolveram um guia inédito para ajudar as famílias a reduzirem as alergias alimentares comuns pouco a pouco. Chamada de imunoterapia oral, a terapia envolve a administração de quantidades muito pequenas de um alérgeno, como o amendoim, às crianças e o aumento gradual da quantidade ao longo do tempo para aumentar a tolerância.
Ao introduzir pequenas quantidades do alimento todos os dias, as crianças treinam seus sistemas imunológicos para se tornarem tolerantes a esses alimentos, deixando de reagir com alergia.
Até agora, os médicos não tinham como fornecer aos pacientes uma orientação padrão para a imunoterapia oral. Essas novas diretrizes, apresentadas num artigo publicado nesta segunda-feira (08/04) numa revista especializada, foram desenvolvidas para servir de base aos médicos e padronizar o tratamento de crianças com alergias alimentares.
“Este é um artigo de referência em nosso campo, pois a padronização do tratamento é inédita. Estávamos precisando muito de algum tipo de orientação sobre como abordar a imunoterapia oral”, explica Douglas Mack, especialista em pediatria da Universidade McMaster, no Canadá, e autor principal do estudo.
Cerca de 4% das crianças e 1% dos adultos em todo o mundo foram diagnosticados com algum tipo de alergia alimentar. Mas a prevalência é maior nos países ocidentais, onde 8% das crianças e 4% dos adultos têm alergias alimentares.
O alimento de uma criança pode ser o veneno de outra: as alergias a amendoim predominam no Reino Unido, nos Estados Unidos e na Austrália, mas são incomuns na Ásia, onde as alergias a trigo, ovo e leite são as mais frequentes.
As taxas de alergia alimentar têm aumentado nas últimas duas décadas, o que os cientistas acreditam ser devido ao aumento do saneamento e da limpeza. A ideia é que, com menos germes ao redor, o sistema imunológico das crianças se volta contra coisas inofensivas, como amendoim ou leite. Outros fatores incluem: a deficiência de vitamina D e o momento em que as crianças são expostas a alérgenos alimentares quando bebês.
Autoridades de saúde de muitos países afirmam que os bebês devem ser expostos lentamente a possíveis alérgenos para evitar alergias. As famílias com histórico de alergias alimentares são aconselhadas a trabalhar sob a orientação de um pediatra.
A imunoterapia oral tem um longo e bem-sucedido histórico de ajuda a crianças com alguma alergia alimentar. Ela foi aplicada pela primeira vez em 1908 para dessensibilizar um garoto de 13 anos que tinha alergia a ovo. Após seis meses, ele passou a poder comer ovos com segurança.
“Temos um tratamento que funciona e sobre o qual os médicos têm ampla concordância em vários domínios. Há muitos estudos examinando muitas abordagens diferentes para continuar a refinar os tratamentos para melhorar a segurança, reduzir a necessidade médica e ampliar o acesso”, contou Julia Upton, imunologista clínica do Hospital Pediátrico de Toronto, Canadá.
Os tratamentos com imunoterapia oral exigem atenção dos responsáveis, que precisam ficar atentos para os perigosos níveis de exposição a alérgenos. É comum que as crianças apresentem efeitos colaterais como dor abdominal ou vômito.
“As famílias precisam aprender sobre alergias alimentares, anafilaxia, imunoterapia, como dosar o alimento com segurança, o que procurar na embalagem, quando tratar e quando entrar em contato com a equipe médica”, afirmou Upton.
De acordo com os autores do novo guia, cerca de um terço dos pacientes não foi preparado antes de iniciar o tratamento. “Se as famílias não estiverem preparadas para a imunoterapia oral, ela vai falhar ou não ser segura. Essas famílias precisam lidar com a terapia todos os dias. É por isso que essas orientações são tão importantes”, explicou Mack.
As orientações foram elaboradas para os médicos e não diretamente para os pais ou responsáveis, por isso é importante o trabalho em conjunto com os médicos para ajudar as crianças no processo de dessensibilização de forma segura e eficaz.
Mas o estudo também contém informações úteis para pais e responsáveis. “Por exemplo, as vias aéreas precisam ser bem controladas antes e durante a imunoterapia, e várias instruções de segurança e dosagem precisam ser seguidas”, afirmou Upton.
A especialista vê a terapia como um treinamento físico para uma maratona – as crianças precisam de treinamento diário contra alergias, e a resistência cai se elas interromperem a imunoterapia oral. “Para muitas pessoas que têm alergia a alimentos, o sucesso alcançado pela imunoterapia depende da exposição contínua. Isso geralmente requer um longo acompanhamento e, portanto, é muito importante que as famílias vejam que há um consenso médico”.