1) O QUE É
A audiência de custódia é um ato processual penal no qual toda pessoa presa, seja decorrente de prisão em flagrante, cumprimento de mandado de prisão ou prisão preventiva, deverá ser apresentada a um juiz em até 24 horas.
A realização da audiência de custódia está, primeiramente, prevista no Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas e na Convenção Americana sobre Direitos Humanos, porém, mesmo com esses tratados já incorporados ao Direito brasileiro, esse tipo de audiência ainda não era realizada no Brasil.
Apenas em 2015, o Supremo Tribunal Federal na ADPF nº 347/DF determinou que fossem realizadas as audiências de custódia no prazo máximo de 24 horas, contado do momento da prisão.
Diante dessa decisão do STF, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ editou a Resolução nº 213, a qual regulamenta a audiência de custódia (Resolução nº 213: Dispõe sobre a apresentação de toda pessoa presa à autoridade judicial no prazo de 24 horas).
Em 2019, com o advento da Lei nº 13.964/19 – Pacote “anticrime” foi incorporado, finalmente, ao Código de Processo Penal, o art. 310, que dispõe sobre a audiência de custódia.
“Art. 310: Após receber o auto de prisão em flagrante, no prazo máximo de até 24 (vinte e quatro) horas após a realização da prisão, o juiz deverá promover audiência de custódia com a presença do acusado, seu advogado constituído ou membro da Defensoria Pública e o membro do Ministério Público (…)”
O prazo de 24 horas para apresentação do preso à autoridade judicial, é contado a partir do momento em que o Auto de Prisão em Flagrante, mandado de prisão ou comunicação da prisão sejam recebidos no fórum, conforme art. 310 do CPP combinado com o artigo 1º da Resolução 213 do CNJ.
2) FINALIDADE
A audiência de custódia tem por finalidade a proteção e garantia da integridade física e psíquica da pessoa presa, coibindo excessos como tortura, maus tratos e abusos no momento da prisão, os quais deverão ser observados pelo juiz da audiência de custódia.
Ao ser apresentado o preso à autoridade judiciária, deverão ser observadas se há alguma violação aos Direitos Humanos.
Verificando a presença de tortura e maus tratos, deverá o juiz, tomar as providências cabíveis para investigação e eventual denúncia e preservação da segurança física e psicológica da vítima, que será encaminhada para atendimento médico e psicossocial especializado.
Também serve (ou pelo menos deveria servir) como um filtro para evitar prisões desnecessárias, a fim de atenuar a superlotação carcerária e os gastos que decorrem da manutenção de presos provisórios.
3) COMO FUNCIONA
Após o comunicado da prisão, em até 24 horas, deverá o preso ser apresentado à autoridade judiciária, sob pena de ilegalidade da prisão em flagrante, devendo, portanto, ser relaxada imediatamente.
A audiência de custódia é célere, dura cerca de 10 a 15 minutos e deve ser realizada na presença, obrigatoriamente, do Ministério Público e da Defensoria Pública (caso o custodiado ainda não tenha constituído advogado).
Antes da apresentação da pessoa presa ao juiz, será assegurado seu atendimento prévio e reservado com seu advogado constituído ou defensor público, sendo vedada a presença de policiais.
Na audiência, o juiz deverá:
– Informar ao custodiado sobre o seu direito de permanecer em silêncio;
– Assegurar que a pessoa não esteja algemada, salvo em casos de resistência e fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, devendo, nesses casos, ser justificada por escrito a necessidade do uso de algemas;
– Questionar se lhe foi dada a oportunidade de se consultar com seu defensor previamente;
– Indagar sobre como se deu a prisão, o tratamento em todos os locais por onde ele passou (do momento da prisão até a audiência de custódia);
– Questionar sobre a ocorrência de eventual tortura e/ou maus tratos;
– Verificar se houve a realização de exame de corpo de delito.
Após os questionamentos acima, o juiz deferirá ao Ministério Público e à defesa perguntas compatíveis com a natureza do ato, DEVENDO INDEFERIR PERGUNTAS RELATIVAS AO MÉRITO DOS FATOS.
Em seguida as partes será requerido pelas partes:
– O relaxamento da prisão em flagrante (quando essa for ilegal);
– A concessão da liberdade provisória com ou sem fiança e com ou sem aplicação de medidas cautelares (quando não estiverem presentes os requisitos autorizadores da prisão preventiva);
– A conversão em prisão preventiva (SE estiverem presentes os requisitos autorizadores do art. 312 e seguintes do CPP);
– Novo exame de corpo de delito quando:
a) Não tiver sido realizado;
b) Os registros se mostrarem insuficientes;
c) A alegação de tortura e maus tratos for após a realização do exame;
d) O exame tiver sido realizado na presença de alguma agente policial (em hipótese alguma o exame pode ser realizado na presença de agentes policiais).
Após realizada a audiência de custódia, o Ministério Público oferecerá a denúncia e o processo andará normalmente.
4) CONSIDERAÇÕES FINAIS
Infelizmente o Brasil possui uma cultura punitivista e de encarceramento em massa, onde primeiro prende o indivíduo para depois averiguar os fatos.
Em 2020, o número de presos no Brasil passou de 700 mil, sendo que mais de 220 mil são presos provisórios. Fonte: Anuário Brasileiro de Segurança Pública.
Trata-se de um índice muito elevado de pessoas colocadas atrás das grades sem antes ter um julgamento justo, observadas suas garantias constitucionais de contraditório, ampla defesa, presunção de inocência, ou seja, presos sem uma condenação definitiva.
Sobre esse ponto, em breve farei novo artigo para abordar sobre as prisões preventivas.
AUTOR
Rafaela Gaspari – Advogada CriminalistaGraduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Paraná – PUCPR. Membro do Grupo de Estudos sobre práticas na advocacia criminal – OAB/PR. Atuação focada na área criminal.