Em 2011, a Lei nº 12.514/11 modificou a Lei 6.932/81 (que regulamenta as atividades do médico residente), fazendo constar em seu artigo 4º, § 5º, Inciso III, da Lei nº 6.932/81, que o residente faz jus ao recebimento de auxílio moradia, vejamos:
§ 5o A instituição de saúde responsável por programas de residência médica oferecerá ao médico-residente, durante todo o período de residência:
(…) III – moradia, conforme estabelecido em regulamento.
Essa moradia deve ser disponibilizada in natura (de forma física) ou in pecúnia (acréscimo monetário). No entanto, apesar das instituições costumarem pagar a bolsa-auxílio que a lei determina, raramente asseguram moradia ao médico residente ou pagar qualquer acréscimo nesse sentido.
Sobre a temática, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já pacificou o entendimento de que a instituição, na hipótese de não oferecer a moradia in natura (física), deverá converter essa obrigação em resultado prático equivalente ou perdas e danos (indenização pecuniária):
ADMINISTRATIVO. MÉDICO RESIDENTE. AUXÍLIO-MORADIA. LEI 6.932/1981. TUTELA ESPECÍFICA. CONVERSÃO EM PECÚNIA. ADMISSIBILIDADE. PRECEDENTE. 1. Trata-se, originariamente, de Ação Ordinária que debate a concessão de auxílio-moradia a médicos residentes. Houve denunciação da lide à União. A sentença de improcedência de ambas as pretensões foi mantida pelo Tribunal de origem. 2. Precedente do STJ, na interpretação do art. 4º, § 4º, da Lei 6.932/1981, impõe às instituições de saúde responsáveis por programas de residência médica o dever de oferecer aos residentes alimentação e moradia no decorrer do período de residência. A impossibilidade da prestação da tutela específica autoriza medidas que assegurem o resultado prático equivalente ou a conversão em perdas e danos – CPC, art. 461 (REsp 813.408/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 15.6.2009) . 3. A fixação de valores do auxílio pretendido demanda investigação de elementos fático-probatórios. 4. Recurso Especial provido, determinando o retorno dos autos à origem a fim de que estabeleça valor razoável que garanta resultado prático equivalente ao que dispõe o art. 4º, § 4º, da Lei 6.932/81. (STJ – REsp: 1339798 RS 2012/0175999-7, Relator: Ministro HERMAN BENJAMIN, Data de Julgamento: 21/02/2013, T2 – SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 07/03/2013).
Seguindo a linha do Superior Tribunal de Justiça, o Representativo 125, expedido pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais em julgamento do representativo de controvérsia ‘77’, fixou entendimento no mesmo sentido:
ADMINISTRATIVO – RESIDÊNCIA MÉDICA – BENEFÍCIOS – ALIMENTAÇÃO E ALOJAMENTO – LEI 6.932/81 – INADIMPLEMENTO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER MESMO COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 10.405/2002 – CONVERSÃO EM PECÚNIA – JURISPRUDÊNCIA DO STJ – INCIDENTE CONHECIDO E PROVIDO EM PARTE – SENTENÇA E ACÓRDÃOS ANULADOS.
Isso ocorre porque “existindo dispositivo legal peremptório acerca da obrigatoriedade no fornecimento de alojamento e alimentação, não pode tal vantagem submeter-se exclusivamente à discricionariedade administrativa, permitindo a intervenção do Poder Judiciário a partir do momento em que a Administração opta pela inércia não autorizada legalmente”, conforme explicado no julgamento do AgRg nos embargos de divergência em RESP nº 1.339.798.
Embora não haja previsão legal acerca do valor a ser pago, o Judiciário tem concedido um percentual de 30% sobre o valor bruto da bolsa auxílio paga pela residência ao médico residente, pois a indenização deve possuir “valor razoável que garanta um resultado prático equivalente”.
Ainda, por se tratar de valor de cunho indenizatório a ser fixado por arbitramento do magistrado, não é necessário que o residente comprove despesas que dispendeu com moradia durante o tempo requerido.
Inclusive, o direito ao recebimento do auxílio moradia independe das condições econômicas do médico residente, se ele mora de aluguel, se mora com os pais ou se mora perto/longe do local da residência.
Por fim, é importante ressaltar que este benefício, previstos na Lei nº 6.932/81, não possuem relação com questões trabalhistas, sendo apenas um benefício estudantil.
Para exemplificar: a bolsa estabelecida pelo CRNM tem o valor aproximado de R$3.300,00. Se a residência médica tiver uma duração de 3 anos, o valor indenizatório será de aproximadamente R$35.640,00, devidamente corrigidos.
Assim, caso a instituição descumpra com esse dever legal, o médico residente pode recorrer ao Judiciário para obter o benefício. É possível requerer judicialmente o auxílio tanto durante a residência, quanto após seu término, possuindo o prazo prescricional de até 5 (cinco) anos para entrar com esse tipo de processo.
Gisanne de Oliveira– Advogada do escritório De Oliveira Advocacia e Consultoria (@deoliveiraadvocacia). Graduada em Direito pela Universidade Federal Fluminense (UFF), mestra em Justiça Administrativa pela Universidade Federal Fluminense (UFF) e pós-graduada em Direito Médico pela Verbo Jurídico (@justicaparamedicos). Faz parte do Conselho Editorial da Revista Id Online Revista Multidisciplinar e de Psicologia e da Amadeus Internacional Journal. É membro da Comissão de Direito Médico e Saúde da OAB/PE.