Judiciário
A tese da Legítima defesa da honra e o Feminicídio no Brasil
Uma análise sobre a decisão da inconstitucionalidade da legítima defesa da honra, segundo o relator do STF, Dias Toffoli
Uma análise sobre a decisão da inconstitucionalidade da legítima defesa da honra, segundo o relator do STF, Dias Toffoli
Após a decisão do Ministro Dias Toffoli, sobre a inconstitucionalidade da legítima defesa da honra, surge a necessidade de entender as consequências jurídicas e sociais que essa decisão causa na realidade judiciária brasileira.
Nesse presente artigo, trago brevemente os principais pontos sobre a Legitima Defesa, suas teses e uma relação com os índices de feminicídio no país, através da deliberação do Ministro Toffoli sobre a temática.
Segundo o Artigo 23, Inciso II, e 25 do nosso Código Penal, a legítima defesa é um excludente de ilicitude, significando dizer que o cidadão não será responsabilizado legalmente por um ato.
Ela determina que em situações de agressão atual ou iminente, a vítima possa reagir utilizando-se dos meios necessários para defender a si, outra pessoa ou um patrimônio – legítima defesa de patrimônio-. Dessa forma, quem age em legítima defesa não comete crime, não havendo lei.
Contudo, existem situações que desconfiguram a legítima defesa, como por exemplo um ato de vingança, punição de uma pessoa para satisfazer pretensões e desejos. Nesses casos é crime, devidamente normatizado pelo código penal, com pena de reclusão de 15 dias a um mês e multa, além de responder pela pena correspondente ao ato praticado.
Essa tese, embora não esteja prevista em legislação, percorre o mundo jurídico a muito tempo, sendo utilizada por diversas vezes para absolvição de réus, principalmente em Tribunais de Júri (também conhecido como júri popular). Na maioria das vezes a tese da legítima defesa da honra está ligada a crimes passionais, mas não se resume a eles.
Quando falamos no código penal, nos artigos sobre legítima defesa, o texto não identifica qual bem jurídico será objeto de proteção, basta, portanto, que haja uma injusta agressão e que a vítima se utilize de meios necessários para repeli-la. Com isso, a tese pode ganhar destaque para situações em que a honra de um cidadão possa ser insultada ou ridicularizada, levando a vítima a procurar meios de “protegê-la”.
Entre as diversas questões jurídicas no País, vale-se destacar a relação da legítima defesa da honra aos casos de Feminicídio, através de casos, como por exemplo, de infidelidade conjugal, ligados aos crimes passionais.
Essa tese, comumente utilizada para a defesa de crimes de violência contra mulher, foi responsável por manter impune homens entre as décadas de 1940 a 1970. Onde, diante do tribunal de júri, formado por cidadãos leigos escolhidos entre os membros da comunidade, ganhavam os debates o advogado com a melhor retórica.
Casos como o assassinato de Ângela Diaz, morta em 1970 pelo companheiro Doca Street, empresário absorvido pelo crime de homicídio, acobertado pela tese da legitima defesa da honra, fazem parte do histórico cruel de feminicídio no Brasil. Esses argumentos devem ser levados em consideração ao se pensar na soberania intocável do tribunal de júri.
Tal ação transforma toda a luta social e suas significações em poeira, e traz de volta a memória de um passado sustentado pela tese de lavar a honra com sangue. Segundo o ministro Moraes: “Até décadas atrás, a legítima defesa da honra era o argumento que mais absorvia os homens violentos (…), o que fez o País se tornar campeão de feminicídio”.
Tal brecha, utilizada pela defesa de réu, em tribunal de júri, para justificar feminicídios em ações criminais, foi questionada pelo Partido Democrático Trabalhista, que afirma existir controvérsias constitucionais entre as decisões do Tribunal de Justiça e o STF.
O partido pediu ao Supremo que, interpretasse a Constituição de forma que pudesse impedir que os Tribunais do Júri se utilizem da tese da legítima defesa da honra para aplicar a exclusão de ilicitude e a legítima defesa, ambas na legislação penal brasileira, aos crimes de feminicídio.
A decisão foi tomada pelo ministro Dias Toffoli, dia 26 de fevereiro de 2021, que concedeu parcialmente medida cautelar na ADPF 779 para firmar o entendimento de que a tese da legítima defesa da honra é inconstitucional, por contrariar os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da proteção à vida e da igualdade de gênero.
Para Toffoli, legítima defesa de hora não pode ser confundida com legítima defesa, pois somente a legítima defesa contém excludente de ilicitude, enquanto a tese de legítima defesa de honra, na realidade é movida por emoção ou paixão e já está inserida no código penal. artigo 28, não excluindo a impunibilidade penal.
Podemos concluir então, que nosso país vive uma nova era de configurações das decisões judiciais. Onde, embora ainda se existam decisões que fogem ao princípio da justiça e proporcionalidade de penas, muitas são as decisões dentro do nosso ordenamento que ainda devem ser debatidas, decididas e questionadas. Para que os princípios constitucionais sejam garantidos, de acordo com as relações históricas e as necessidades sociais do cidadão. E assim, o passado tenebroso dos processos judiciais injustos e parciais fiquem apenas com uma fase da esfera jurídica brasileira.
https://istoe.com.br/legitima-defesa-da-honra/
AUTORA
Gabriella FerrazDireito e EmpreendedorismoGraduanda no curso de Direito no Centro Universitário Cesmac, cursando atualmente o quarto (4°) período, com interesse na área de Empreendedorismo Jurídico jovem e projetos de cunho social. Cofundadora da Liga Acadêmica de Empreendedorismo Jurídico(LAJE JURÍDICA), onde comecei a exercer meus conhecimentos sobre Empreendedorismo jovem. Ex-assessora de Gente e Gestão e Marketing, na Empresa Júnior de Direito, Pontesjud Soluções Preventivas. Fundadora da empresa Jus Athena Marketing Jurídico. Meu foco é procurar oportunidades de inovar e crescer no mercado de trabalho através da visão empreendedora, buscando diminuir as desigualdades sociais e criando redes de apoio para jovens com pensamento inovador que visam, assim como eu, a mudança da sua realidade atual.